ainda sobre reggae

o que eu não gosto dessa coisa do adams é que eu realmente não consigo pensar alguém dizendo “meu compositor predileto é john adams”
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tipo, por qual motivo alguém preferiria adams a bartók
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acho que as pessoas deveriam ler adams como o momento em que música clássica contemporânea se confirma como um gênero
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e por isso abdica de ser um bastião histórico
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de qualquer tipo de desenvolvimento
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assim, conciliamos as duas posições
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adams continua sendo “algo” ligado a uma ideia de “pós-modernismo”, só a aplicação que se torna local
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ele confirma que uma região da música contemporânea virou reggae e que de lá não devemos procurar para falar sobre características “críticas” da música


postado em 19 de fevereiro de 2023, categoria comentários : , , , ,

esculpir com fogo

a tese é como a hidra. e se o prazo que se aproxima lança-se como o fogo que cauteriza a proliferação, é no embate que, decepando da forma que podemos, acabamos ao final com um oponente diferente.


postado em 30 de janeiro de 2023, categoria comentários : , ,

música e palavra #1

existe algo de verdadeiramente desconcertante no fato de que, em geral, tudo fica mais arrastado em óperas e não apenas somente mais lento. concentrando-nos nas frases e deixando de lado a ação, depois de ver como la bohème de puccini, a excessão da primeira cena, acaba por assassinar o espírito leve e sagaz da obra original de murger (scènes de la vie bohème), perguntamo-nos, por contraposição, se não seria o caso da música possibilitar uma maior velocidade na transmissão de informações. há algo disso em alguns raps, mas é notório que os refrões cantados desaceleram tudo, investem em sentimento. e para ser justo com puccini, ele tenta compensar o ritmo retesado com incursões polifônicas onde dois diálogos ocorrem ao mesmo tempo.

(lembro vagamente de alguma cena de ópera de mozart onde há quatro linhas de texto simultâneas, que garantiriam sua inteligibilidade por ser música. mas ser inteligível como contraponto musical, entre quatro linhas melódicas, não é ainda transmitir a informação dos textos)


postado em 27 de janeiro de 2023, categoria comentários : , , , , ,

teste da copa

a copa do mundo testa a hipótese de que cancelamento é uma questão de pequenos poderes.


postado em 1 de dezembro de 2022, categoria comentários : , , , , , , ,

o erro é dos outros

é comum, em apresentações de edições acadêmicas, que o autor revele ter sido auxiliado por muitos e seus apontamentos valiosos. “as falhas, entretanto, são todas de minha responsabilidade”, dirá em seguida, eximindo seus interlocutores de qualquer imputação possível de má influência. “os erros são meus”, entretanto, pode significar que, se há algo de novo ali, é na parte nova autoral que se deve buscar o que não procede. contribuir de modo inovativo e certeiro aconteceria apenas no trabalho de outrém, quando na função de conselheiro.

de minha parte, quando estou fazendo colagens musicais, digo exatamente o contrário. ali, não basta garantir ter feito meu melhor, mas sim ter feito o melhor possível. assim, as eventuais falhas serão todas de responsabilidade dos artistas sampleados e falarão sobre eles e não sobre mim, ou sobre a colagem. afinal, não se trata de meta-colagem, mas de metalinguagem (ou seja, não se trata de meta-metalinguagem). os acertos são de minha responsabilidade, enquanto os erros são todos culpa dos outros.

(meu álbum palavra palavra deve sair em breve, pelo estranhas ocupações. subi minha versão de rosa, de pixinguinha, em meu bandcamp, como tira-gosto)


postado em 7 de setembro de 2022, categoria comentários, música : , , , ,

masque-z vous

na novela suprema da paranóia, os três estigmas de palmer eldritch, superando até mesmo o homem duplo, do mesmo philip k. dick, a droga chew-z alcança os pícaros da bad trip total ao lançar certos usuários em um espaço-tempo refeito e labiríntico cujas imagens retidas então populam a existência sóbria como efeitos colaterais, tornando igualmente labiríntica a determinação do que é real. afinal, estamos ou não ainda mergulhados no mundo alucinatório proporcionado pela mastigação da substância?

mas se palmer eldritch e sua aparência grotesca, mais os mostruosos glucks, não comparecessem. e se, ao invés de remeter a bifurcações de nossa vida, quando já tomamos uma decisão mas talvez tomássemos a outra, uma outra droga nos transportasse para uma realidade exatamente idêntica à nossa, mas ilusória? e fosse progressivamente difícil distinguir então se algo aconteceu aqui ou ali, da mesma forma que determinar qual das duas é de fato àquela em que há consequências materiais, se é que são apenas duas realidades e se é que existam consequências materiais, ou se essa materialidade não é ideal, efetiva nos n-mundos que são o labirinto do mesmo mundo vivido fenomenológico. fiquei imaginando que esse jogo de indiscerníveis e a confusão resultante nesse cubismo deveria ser contada em primeira pessoa, em um processo gradual de dissolução da confiança na consistência de um real que, entretanto, recusa a sair do banal.


postado em 10 de dezembro de 2021, categoria comentários : , , , ,

estou sentado em uma sala

como muitos outros, fiquei completamente fascinado quando escutei i am sitting in a room, tanto pela sonoridade, desenvolvida aos poucos, em processo lento, quanto pelo que estava ali envolvido (uma maneira muito poética de trabalhar musicalmente a ideia de que uma sala tem uma acústica específica). tanto que, quando dava aulas de arte sonora, mas até mesmo de criação e registro sonoro, sempre mostrava aos alunos da oi kabum! essa peça. e em seguida experimentávamos o processo: gravar uma fala ou alguns sons em uma sala. tocar essa gravação na mesma sala e gravá-la de novo. e novamente e assim por diante. presenciar o mistério da filtragem e reforço sucessivo de certas frequências até que a sala parecesse usar nosso estímulo inicial para expressar suas preferências, seu ser sonoro.

esses dias estava pensando sobre como essa música pode de fato ser dita canônica, dentro do âmbito da música experimental. por ser desconhecido no mundo afora, não fui convidado para a comemoração de 90 anos de alvin lucier, em que 90 artistas diferentes executavam a obra em diferentes espaços e condições. mas já tinha construído uma versão, em 2016, pensando em homenagear esse incansável explorador sonoro, falecido hoje (01 de dezembro de 2021).

a ideia era que, dada a força de i am sitting in a room, ligada às versões executadas pelo próprio lucier, haveria em toda sala, agora ligada à sua acústica, um potencial-lucier: o conjunto de frequências articuladas a partir do processo reiterativo de lucier como aspecto virtual para qualquer sala. e de certo modo, isso significava para mim que se filtrássemos a expressão de cada sala, sucessivamente e gradativamente, de toda sua força expressiva, o que sobraria ao final seria a voz do bom velhote.


postado em 1 de dezembro de 2021, categoria comentários, música : , , ,

a vida secreta das plantas

uns dias atrás gravei um pequeno vídeo filmando algumas plantas que comecei a cultivar aqui em casa durante a quarentena. na cartela de apresentação, exibo o título: “plantas crescendo”. a ideia é que matthias koole improvise musicalmente enquanto assiste um pedacinho desse processo, na verdade invisível. a gravação foi feita para a temporada 13 das quartas de improviso.

antes disso a carolina botura estava me falando sobre a conexão de seu novo trabalho artístico com as plantas (mais sobre isso em breve) e eu fiquei matutando o que eu acho sobre as elas. e cheguei à conclusão que o que me fascina tem a ver com a temporalidade, que na minha relação com as plantas o que presencio é seu lento crescimento. este é invisível, embora existam, na rotina, indícios aqui e ali; o processo é suficientemente lento para que minha memória não retenha os diferentes estados e eu não consiga apreender as diferenças entre um estado e outro. até que… ocorra uma micro-ruptura. e de-repente há uma mudança dentro de um “nada acontece”.

com as flores há uma condensação de energia e também de tempo: as coisas se ajustam mais à escala do cotidiano humano, mas em meio à um regime de atenção que dispenso às plantas, uma estrutura do “já passou” e do efêmero se estabelece. a flor mal floresce já fenece, a flor que estaria conectada a essa estética do crescimento mínimo e contínuo.


postado em 19 de julho de 2021, categoria comentários : , , ,

duas luas

é sabido que o valor de uma coisa não é a coisa. que o valor de uma coisa é imaterial. e que uma arte imaterial chega, assim como os avanços financeiros mais derivativos, próximo a essa essência, onde o valor se converte em quantidade=dinheiro, evitando ao máximo a incorporação ou corporificação em algo. seja uma escultura imaterial (mas que deve possuir um contrato) ou uma expectativa de venda bem sucedida de galões de gasolina (mas que deve possuir um contrato), sentimo-nos próximos da abstração máxima e como no ditado, muitas vezes olhamos pro dedo ao invés de olhar para a lua.

mas há quem diga que, se o dedo é bem determinado, isto é, o absurdo de um artista fazer uma obra imaterial que custa milhões (ou apenas algumas centenas), ou um negociador gastar mais em garantias de negócios do que em negócios (movimentando no total mais que os negócios propriamente ditos), a lua nos evade. talvez não. se há contratos há ainda um lastro material, mas mesmo que não houvesse, a base que fornece a possibilidade de valorar ainda é a confiança. que ela se desincorpore também na arte, ao aproximar do abstrato, do imaterial, mergulha o artístico na pura realidade. expulsa de seu mundo imaginário, isto é, preso ao sensível, a arte torna-se parte do mundo, nosso mundo composto por coisas absolutamente imateriais como leis, dinheiro, acordos, significados. obviamente que a confiança deve estar vinculada a formas de vida, bastante materiais. mas há um movimento de fuga, o momento do realismo (capitalista).

(eu ainda acreditaria que o absurdo de tudo isso é a ideia de que concentrar renda é aceitável)


postado em 3 de junho de 2021, categoria comentários : , ,

2020 continua

é verdade que ando ouvindo as listas de álbuns de final de ano e conferindo aqui e ali os comentários sobre os animes que sairam. é também verdade que faço votos para que todos possam ter uma boa passagem de ano, e que eu mesmo realizarei uma pequena comemoração. ainda assim, e mesmo que meus colegas tenham tentado se despedir de 2020, dizendo-lhe um ruidoso adeus, parece-me que o ano permanece. digo: 2020 continua. na virada, por mais que tentemos nos alegrar, haverá uma melancolia inalienável, que faz bem não expurgar: o primeiro de janeiro chega, mas não o ano vindouro. este não chega porque 2020 conseguiu constituir-se como irmanado com a sindemia atual (a sinergia entre governo militaresco desastroso e pandemia). então, haverá algo de demoníaco, como nos relógios dos filmes de terror satânicos, indicando 6:66. e eu gostaria de reconhecer estar sobre esse encantamento. durante toda minha vida minha família se reunira para o réveillon e o mochi com ozoni do dia seguinte. esse ano não. de acordo, sinto uma certa exaustão e relutância de publicar agora os textos das séries aoty e retrospectiva. penso que seria melhor fazê-lo depois do janeiro das lágrimas e depois da primeira leva da vacinação. comemorar 2021 quando finalmente recebermos a segunda dose. daí, poder desejar e acreditar no desejo de um bom 2021.


postado em 31 de dezembro de 2020, categoria comentários : , , ,