João Felpudo e a Consequência Imediata

Não é suficiente alertar no maço de cigarro dos malefícios que ele possa causar. Malefícios, estou fumando, muitos fumam, não acontece nada. Alguma tosse, vício, mas ainda assim, é melhor que pior não? E podem haver inúmeras causas para o câncer da fulana. De qualquer forma, que azar! Mas e cicrano, bem até hoje e pura fumaça? Então, maços com fotos: doenças, sofrimento, destruição: olhem aqui, sua filha que não mais respira direito, a sua amiga que abortou, o dono da sinuca que teve membros amputados. Cuidado, trombose, destruição da saúde de seus amigos, um cancerzinho na língua, virar escravo do tabaco, nunca mais dar no coro, evelhecer precocemente, ô velho caquético, fedido.

Pois lembrem: João Felpudo não cortou unhas e nem aparou o cabelo, ficou tão feio que ninguém mais dele chega perto. Frederico chicoteou o cachorro, que lhe revidou uma mordida, comeu sua refeição, e ele de cama com remédios amargos. Paulinha pegou os fósforos e se queimou até as cinzas. Os moleques racistas foram pintados de preto. O caçador descuidado, pela lebre caçado. O chupa dedos, com todos seus dedos tesourados. Gaspar que não comeu sopa e morreu de fome. Felipe, que de balançar na cadeira derrubou tudo em si. O menino do nariz empinado que por não olhar por onde anda se afogou. Beto que sai na tempestade e voou pra longe e nunca mais foi visto.

As histórias divertidas com desenhos cômicos do Dr. Heinrich Hoffmann já alertavam as crianças: não à toa, os pais, sim, não à toa. É preciso atentar: há sabedoria nos conselhos e proibições; se justamente eles, e o caro Hoffmann já foi um infante, chegaram ao mundo adulto, é porque não se tratava simplesmente de se conformar a um mundo distante de costumes e etiquetas arbitrárias e impostas. Havia sabedoria sim. As crianças não são meros joguetes dos adultos, que as aproveitam para todo tipo de jogo de controle inútil, desgastante e sádico. Há um valor maior na cultura. Pois as consequências seriam muito mais severas do que imaginávamos a princípio, e muito mais próximas. E sim, elas seriam mais divertidas, porque cruéis e imediatas. Aliás, que chatice esperar: não quero escovar os dentes, não escovo. Cáries? Que isso, por isso meu primo chorava? Mas que besteira. Quantos meses passo sem nenhuma dorzinha. Se não escovo hoje amanhã ainda estou bem, se não escovo hoje amanhã estou bem… Por quanto tempo isso ainda vai se estender? Por sorte, já no segundo dia levo uma baita bronca da mãe e nada de sobremesa. Mas qual a graça nisso? Que mãe histérica, apressada. Ela o faz para meu bem? Será mesmo? Odeio escovar, ela não sabe o enorme desgaste mental que dá pegar aquela escovinha, aquela pasta branca. E meus dentes são fortes.

Mas e se todos meus dentes caem, um por um, um por dia? O que é uma puniçãozinha perto disso? Escovar os dentes, questão de sobrevivência. Quando você não vacina seu filho ele pega uma doença mortal e transmite pra todos os outros ignobeizinhos, esses evitadores de agulha. Então, orgulhe-se: olha meu braço picado; e olha o vexame, a mãe dele não o levou: vou rir quando morrer, febre amarela, sujeira nas unhas, quando engolir uma lesma e sufocar. Que criaturinha! Ass: nós as boas crianças.

Então, às vezes até mesmo Deus fica impaciente e manda um dilúvio. Tão vendo, não se comportam, viram pó. E é porque éramos suas crianças, e ele o pai. Mas não mais, temos agora os especialistas. Mas muito foram comprados. E há alertas demais, frescura, tempestade em copo d’água, essa poluição não é de nada, olha só, estou aqui bem, hoje, hoje (amanhã), hoje (depois de amanhã)… E minha arma, quem disse mesmo que é ruim brincar com ela?

O aquecimento global está aí. Mas estando aqui, ele está lá, ali, longe. Onde está nosso médico, nós também, doentes da previdência, do planejamento, crianças levadas – grandes empresários… Era uma vez sr. Votorantim, que construiu uma fábrica poluente e então morreu sufocado, ele e sua família e os funcionários. Era uma vez sra. Shell que com sua petrolífera furou um buraco no gelo e liberou metano, e o planeta inteiro com pneumonite. Sra. Tereza Cristina jogou agrotóxico nas plantações todas mas acabou comendo uma cenoura da sua colheita e faleceu intoxicada. Do Sr. Schvartsman nem falo, esse encontra-se inteiramente órfão, e aparentemente não há adultos que dêem conta.

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