Na hora da repescagem, o que eu recomendaria que possivelmente vocês deixaram passar? Aí vão os “álbuns do ano” (leia-se: aqueles que eu acho que foram possivelmente indevidamente esquecidos/ignorados).
Grupo A: recomendações fortes; tire um tempo e pare para ouvir.
- Boxers: demo pilé. Um som insistente e extravagante de fita k7 podre, em uma progressiva quase revelação de um texto, mas m clima de invocação demoníaca. A fita quer extrair do texto seus ritmos ruidosos e nisso insere mistério ao ambiente.
- Gustavo Torres & J.-P. Caron: ~Ø (não-vazio) m.p.s.s.t.n.g.g.c.o.p.p.g.. Processo de acumulação de ruídos de dois meios – vinil e k7, a princípio reproduzidos sem conteúdo gravado.
- Henrique Iwao: Coleções Digitais. Todos as amostras contendo um tipo de som na trajetória de um artista, costuradas detalhadamente, como todos os vocais do Michael Jackson na sua discografia de estúdio, que não são palavras nem vocalizes melódicos. (fui eu mesmo quem fez, mas isso não é desculpa para deixar de fora)
- Jute Gyte: Oviri. Mistura entre black metal e música de concerto contemporânea, sem deixar de ser dinâmica, fluída e empolgante. O equilíbrio entre o rápido demais e o fraseado inteligível, formando camadas separadas na velocidade mas que se conectam no todo é notável.
Grupo B: escute se a descrição te interessa ou se há tempo para.
- Gnod: Just Say No to the Psycho Right-Wing Capitalist Fascist Industrial Death Machine. Rock barulhento, com efeitos kraut e aqui e ali buscando a energia bruta que nasce do movimento interno à repetição insistente.
- Klein: Tommy (HDB112). Um álbum que substituiu, ao meu ver, aquilo que poderia ter sido, quiçá, oferecido por um Burial. Fantasmas no/do pop.
- Morgan Evans-Weiler: Unfinished Variations (for Jed Speare): violino solo, paciente e sensível, explorando certas notas e suas nuances.
- Richard Dawson: Peasant. Não achei tão incrível quanto o Nothing Important, mas ainda assim um belo álbum, de melodias boas de cantar e letras meio beats. Há uma tentativa de conjugar a guitarra de cordas muito soltas e que desafinam e a voz que estoura de propósito e grita de Dawson com grupos instrumentais tocando de forma convencional.
- Pharmakon: Contact. Aprendi a gostar e apreciar a simplicidade e beleza industrial pop dentro do power electronics.
- The Ars Combinatoria String Quartet: Milton Babbitt String Quartets. Os quartetos de corda do Babbitt, tocados em sequência, e de modo límpido. Música no estilo música chata (mas muito bom/legal).
- Thelmo Cristovam: Electricity/Industry. Um paredão de ruído de estática com movimento interno estável e externo bem lento. Pra ouvir com o som no máximo.
- Yasunao Tone: AI Deviation. Aqui em (1) a construção da arbitrariedade computacional é levada ao seu máximo, porque mantém a aparência de música computacional e de uma sequência nonsense de eventos, enquanto no todo, pela insistência e manutenção da separação entre canais e dinâmicas claras, fornece também a ideia do construído, ou ao menos, de duas IAs se esforçando para serem coerentes, enquanto improvisam. Em (2) essa impressão se solidifica, mas aí, já há um sentido claro de interação, pergunta e resposta.
- Zeitkratzer, Svetlana Spajić, Dragana Tomić & Obrad Milić: Serbian War Songs. Canções relacionadas à primeira guerra mundial, em acompanhamento orquestral saturado e/ou atmosférico mais elementos de acompanhamento tradicionais.