em agosto de 2009 deixei de publicar o seguinte depoimento, na plataforma orkut:
a despeito do que diz, ao apresentar-se, clarissa certamente figura entre o alto panteão das garotas mais dificultosas já encontradas; ela é doce e agradável, mas, conhecendo-a, corre-se o risco de ficar marcardo (e movido) mais pela sua ausência do que pela sua presença.
antes de ser, portanto, uma pessoa negativa (pois é muito querida e positiva), é uma pessoa em negativo. não obstante, como diriam muitos, a esperança é a última que parte e o espírito é grandioso.
meu trabalho abarca todas as formas de arte, incluindo a música experimental, a videoarte, a performance e a literatura, mas não a pintura (e o desenho (e também não estritamente a escultura, o circo e certos tipos de poesia lírica)). isso entretanto não significa desprezar a história dessa grande arte que de vermeer a rothko, passando por turner, encantou ao mundo, e mereceu até mesmo um conto especialmente inspirado de perec (a coleção particular). muito pelo contrário. de modo que meu objetivo final seria criar uma obra de arte cuja alma fosse finalmente indiscernível daquela que, aos espíritos mais refinados, amorosos e atentos, pode-se enfim observar como pertencendo ao cravo bem temperado, de johan sebastian bach. que essa obra não seja uma pintura, mas sim uma coleção de peças musicais, não é aqui relevante (e até onde eu saiba, ela tampouco inspira-se em temas pictográficos, como ferneyhough ao referir-se a matta, em la terre est un homme (não que eu goste muito dessa música, prefiro antes terrain, ou a ópera em torno de walter benjamin (aliás, um escritor medíocre)). é claro, essa obra em si, a que eu me referia, fruto futuro de meus mais empenhados esforços e sonho constante de meus empreendimentos mais delirantes, pouco teria a ver com os dois volumes de 24 prelúdios e fugas, de dó maior, subindo até si menor, duas vezes, como duplos disjuntivos. talvez, e estou consciente da tênue esperança que, como o fio de ariadne, me conduz pelo labirinto da intuição humana (com a diferença em relação ao mito de que, no caso, nem o próprio arquiteto, ao construí-lo, diferentemente de dédalo, entendia bem o que exatamente eram suas paredes, e ficava inteiramente perplexo perante o conceito de saída…), exista essa possibilidade. então, se o conjunto de minha obra, da biografia póstuma, às minhas participações em passeatas, por fim chegando aos períodos de silêncio, aos panelaços, à síntese fm e na conclusão de que uma única fixação me perseguia, ou antes que eu a perscrutava, repetidamente, infatigável, sempre e constantemente, pois bem, se ele ao menos tangenciar essa ideia, mas bem melhor seria atingi-la por completo e então minha vida, como tantas outras, não terá sido uma completa perda de tempo.
um grupo de bichas capitalistas (homens e mulheres) entra no ônibus gritando qual é sua música do é o tchan predileta eu sou a loira do tchan segura o tchan o tchan na arábia cinderela baiana (meu limite para a ostentação do entrenimento é claramente ultrapassado).
terrorismo: um carro de som quase vazio e sem ninguém seguindo passa pela cidade tocando músicas para jesus.
um sujeito muito provavelmente mais novo do que eu me chama de jovenzinho nerd (eu deveria, ao invés de tirar fotos artísticas das cercas colocadas nas praças, o que era minha tarefa no momento, tirar fotos boçais de sua namorada supostamente gostosa).
no bloco das garotas solteiras os momentos mais interessantes foram os que lembram operações militares: abrir espaço para o caminhão, coordenar movimento e pausa, cordão descendo, empurra empurra, necessidade de coordenar coletivamente contra os desejos individuais, consideração de erros de planejamento, táticas redefindas a cada jogada, necessidade de estratégia.
quando comentei “madmax itú” estava me referindo à falta de água (aqua-cola) no estado de são paulo, durante a campanha estadual de desertificação, promovida pelo governo. em belo horizonte, gostaria que os ônibus não parecessem se jogar nas curvas da estrada da fúria rumo àquele lugar verde, das muitas mães. esses dias, ouço a cobradora comentar com o motorista:
vai parar nesses lugares, depois vê no que dá. não devia!
– é.
outro dia mesmo no 4302 o joão foi pelo meio, rapelando os retrovisores, os carros todos parados dos dois lados.
– sei.
eu disse pra não fazer isso e ele: “bem feito”. mas vai que depois os donos vão atrás, perigoso demais sô.
– é nada.
uai, é sim.
– ná. eu já fiz isso. tava na rua prata e aquele corredor, acelerei e ranquei 3 de uma vez só.
depois dá problema.
– dá nada não. quando eles forem atrás você já passou voando.
(nome do motorista, número da linha e nome da rua ficcionalizados.)
1. um colar pingente com a insígnia namastê, com cordinha preta, e também um prisma pequenino acoplado a uma bola dourada do tipo sinete.
2. um sapatênis preto la pag, pé direito, marcado no solado como número 29, mas que serve para mim (que calço 42-3), e em boa conservação: cadarço com fios cinzas nas bordas, bastante simpático.
3. uma camiseta preta ad life style xgg, com um detalhe branco na gola interna e um logo que mostra um coqueiro, em bordado prateado.
4. uma baqueta de bateria, toda carcomida no lado da pegada, quase metade do tamanho de uma nova. a cor dela: marrom madeira.
reinsurgência telúrica-omega (contra o sol, a lama), xerodrome (singularidade desértica da terra – deserto de lama), petropolítica, mineropolítica, guerra como máquina (e não máquinas-de-guerra), ratos-peixes podres (incursão epidêmica desterritorializante), taquiya (não-ação terrorista, “a coisa” de john carpenter, paranóia do inimigo indiscriminável).
o futuro é hoje (william gibson), ou ‘no futuro, nadaremos em lama tóxica’. vulcões negros e tsunamis marrons.
Petropolítica: a cartografia do óleo como uma entidade onipresente narrando as dinâmicas da Terra. De acordo com Hamid Parsani, o óleo é o fundo de todas as narrações. A petropolítica pode ser estudada para perseguir a emergência da Xerodrome (Terra-Deserto) como um clímax plano para a Odisséia da Tubulação ou um mundo cuja narrativa é primariamente conduzida através e pelo petróleo.
[Reza Negarestani: Cyclonopedia, p. 242]
a faixa do epilepsia com o chinese cookie poets pertence à coletânea oil, blood, hate, lançada pela plataforma records.
quando mudei, existia essa ideia, da supremacia brhama, da cerveja barata. em um ano e meio isso mudou radicalmente.
em 2013 escrevi: “ah, ele não vem, está com dengue. ih, um mosquito me picou.” parece que, com a falta de chuva a coisa deu uma acentada.
sentia me envenenado com tanto sal, como um marido pela mulher que arquiteta uma vingança lenta, parcimoniosa, mas sem parcimônia nem lentidão. será que eu merecia esse casamento? agora, nem mais o veneno sinto. outro dia, até adicionei sal à salada.
3. vai lá: feche o cruzamento.
4. às vezes os nativos não entendem, apesar de admitirem que aqui se dirige descuidadamente. um tio meu que trabalhava com turismo e morava em são paulo, dizia que aqui era o pior lugar para dirigir do brasil. uma tia, atriz e moradora do rio de janeiro, que andar de ônibus era uma loucura.
e., sujeito formal, simpático, comedido, habitante de são paulo, considera o prédio do real gabinete português de leitura, no rio de janeiro, o mais bonito do brasil. chegando lá, e com sua tese sobre o tempo na obra de a. em mãos, ou seja, na mochila, com ítens que a possibilitam, e. resolve trabalhar ali mesmo, nesse ambiente magnífico. pergunta ao guarda sobre essa possibilidade. este, responde, em bom carioquês, sei lá. vou chamar a gerente. e quando a moça chega e olha um e aí?, e. se explica todo: eu gostaria de utilizar o espaço, trouxe meu laptop, uns livros, escrevo uma tese sobre a., a concepção do tempo, como é que faço, ao que a gerente interrompe-responde, senta aí porra.
desconcertado, mas entendendo a diferença das culturas, e. ainda olha mais uma vez para a gerente, uma moça magra, algo atlética, deve correr na praia, pensa. ela já com desdém, indo embora, então e. se dirige a uma mesa, vou poder trabalhar, que bom. é aí que intervêm o pequeno poder, e a gerente, de costas, continuando sua saída, retoma, como que a partir de porra e como não quer nada, mas com o gostinho da sacanagem no canto do lábio: mas assina lá no guichê os documentos. e então quase pedem para e. o comprovante de residência que ele obviamente não trouxe. e e. não pode deixar de pensar o óbvio, podia ter simplesmente sentado ali como quem não quer nada, retirado o laptop, não tem quase ninguém aqui, estaria já trabalhando.