nootrópicos, nemocentrismo
1. café, meditação.
2. silêncio, pensamento.
postado em 27 de julho de 2016, categoria comentários : café, meditação, nemocentrismo, nootrópicos, pensamento, silêncio
1. café, meditação.
2. silêncio, pensamento.
elaborei duas frases para irritar as minhas colegas da dança, quando estudava composição musical na unicamp (2001-6):
sensações matam o pensar.
quem se exercita muito, emburrece.
meu objetivo era perguntar, enquanto elas olhavam de volta para mim com desprezo, “quantos livros você leu nesse último mês?”. com uma média superior a um livro por semana, minha vitória era garantida (mesmo que elas descontassem nas práticas que fazíamos juntos, mandando eu subir e descer a porcaria de uma rampa do tamanho de um quarteirão, seguidas vezes). é óbvio que eu tinha em mente um sentido específico de “inteligência” e “pensar”, mas não importa – a dificuldade de leituras aprofundadas era geralmente suficiente para estabelecer o ponto. e ainda havia o fato de que, no período em que eu fazia aulas de balé (moderno, três vezes por semana, com a holly cavrell), e tinha de entender do mundo das “sensações” para fazer trilhas para dança, minha capacidade (isto é, vontade, concentração, disposição) de leitura, diminuíra consideravelmente.
de fato, sensações em demasia dificultam ou impedem o pensar. mas ter pensamentos não é tudo nessa vida; na falta de coisas que te forcem a pensar, eles simplesmente não ocorrem – e nada melhor pra sensibilizar o corpo e a mente a si mesmos que exercícios físicos.
***
acho que sempre associei esses momentos mais sentimentais a aproximações com o caos impensável. pequenas incursões que, no estilingue da existência, pa reenchem de sentido para depois atira-la ao nada da angústia (às vezes, perde-se o alvo e atinge-se o vazio produtor da autocriação).
dado que um novo ano chega, eu poderia fazer meus votos pedindo que o brasileiro apaziguasse um pouco seu amor pela desigualdade social, ou sua crença no mito da lei, ou ainda que diminuísse seu fatalismo, ou seu machismo, mas não.
talvez outras pessoas estejam rezando (no sentido laico) por causas mais efetivas ou ainda mais nobres. eu entretanto, o que eu desejaria para o ano de 2016, é que as pessoas pudessem, acima de tudo, generalizar menos. então feliz 2016.
existe um problema em textos sobre deleuze. é que deleuze gosta de separar polos e quase sempre acaba por valorizar um lado em detrimento do outro – nômades contra sedentários, por exemplo. existe um aristocracismo grande aí. e quando se é tomado de paixão por deleuze, pelo seu pensamento, como é o caso do livro de regina schöpke (por uma filosofia da diferença: gilles deleuze, o pensador nômade, edusp, 2004), mesmo assim ocorre que, ao explicar, ao clarificar deleuze, não se está de fato criando conceitos, rasgando o caos, fazendo máquinas de guerra. é o estado – a academia, criando especialistas em deleuze – deleuzianos – todos eles do lado dos operários da filosofia, reforçando a canonização desse enorme pensador, trabalhando para a territorialização do seu pensamento, para uma maior significação de seus conceitos.
não que isso seja ruim. qual o problema, afinal, de deleuze ser o hegel da segunda metade do XX?
se deleuze, seus textos, são uma força de fora a impulsionar o pensamento, uma pequena máquina a incitar paixões, nem por isso abordagens explicativas podem isentar-se da acusação que tão bem explicitam. porque se fosse diferente, o título do livro específico citado seria “por filosofias da diferença: gilles deleuze, um pensador nômade”.
agora que entreguei a dissertação de mestrado, dois dias antes da minha linha da morte, posso postar esse texto, escrito provavelmente em dezembro de 2011. não postei antes por superstição. por achar que poderia ter efeitos psicológicos malignos que me impediriam de terminar o trabalho no prazo.
pré-qualificação: eu preciso priorizar priorizar o mestrado.
pós-qualificação: pensar pensar é fácil. difícil é pensar.
1. nossa, que rizominha legal.
2. por causa da micropolítica do poder.
3. ele vive numa mônada nua.
4. essa heteronomia é minha.
5. tá lá, no seu momento (de verdade).
6. ela está cheia de vontade (de potência).
7. retornei, é o eterno-retorno.
8. na estação de taxi sublunar.
“durante todo esse tempo eu estive intranquilo. mas a intranquilidade na calma é como o prenúncio da morte: todos vamos morrer algum dia. e se não há um evento mais drástico, o que é essa intranquilidade senão um adiar e um esperar, sem propósito?”
gostaria de lembrar de onde vem essas palavras, de cortazar ou borges, ou mais remotamente de kafka, autores lidos faz tempo. o fato é que a sombra das palavras tem me rondado, e mais que isso: o sentido vago de algo que fica entre o esquecimento e a lembrança: um vapor do pensamento.
nessa dúvida, minhas palavras – delas irrompem palavras de outros, como um sotaque espanhol imaginado. dos espaços entre elas, vazios se fazem significativos, prenhes de ausências (do quê?), que irrompem ou que se escondem, correndo de um lado ao outro.
por isso a dúvida sobre se colocar ou não aspas no primeiro parágrafo; por isso preciso voltar, terminar o texto; por isso continuarei intranquilo.
certos eventos são surpreendentes. mas só o são porque <foram>. e se assim foram, é porque estavam fora do pensável; mas não mais, e então pedem cautela futura, precaução – estratégias para afunilar o possível: “isso não vai ocorrer mais”. estas, por sua vez, falham novamente. os eventos são outros, a precaução versa sobre classes, tipos e procedimentos – a surpresa vêm de acontecimentos: nos lembram <a espiral>, em movimento assintótico. o centro é um limite, esse limite é um horizonte, esse horizonte é aquilo que pretendemos olhar quando caminhamos para frente: mais e mais controle.
da surpresa: ela sussurra, mas só <depois> entendemos: “não tem fim: isso é apenas um <meio> de levar as coisas”.
“quão pequeno é um pensamento necessário para preencher uma vida inteira!
tal como um homem pode passar a sua vida a viajar em torno de um mesmo país e pensar que nada mais há para além dele!
vês tudo numa perspectiva (ou projecção) estranha: o país pelo qual continuas a viajar surpreende-te porque parece enormemente grande; os países que o rodeiam parecem todos pequenas regiões fronteiriças.
se quiseres ir mais fundo não necessitas de viajar para longe; de facto, não precisas de abandonar as tuas cercanias mais imediatas e familiares.”
(wittgenstein, l. cultura e valor. trad. jorge mendes, edições 70, 2000 (1980). pg. 78)
proverb (1985), de steve reich, para três sopranos, dois tenores, dois vibrafones e dois orgãos elétricos. o texto é a versão inglesa para a primeira frase apresentada acima: “how small a thought it takes to fill a whole life!”