quanto ao excesso de sentido da vida

1. a arte reduz/fixa
2. a ciência desloca/elimina
3. a filosofia circunscreve/delimita


postado em 1 de outubro de 2017, categoria aforismos, prosa / poesia : , , , , ,

política

se a filosofia é a arte conceitual cujo material é o pensamento (rosi braidotti falando sobre françois laruelle), então a política é a arte conceitual cujo material é o poder. nisso, a essência do poder continua sendo a estética, de toda forma (o que não tem, ao que parece, relação direta nenhuma nem com o belo nem com o bom).


postado em 7 de junho de 2016, categoria aforismos : , , , , , , , ,

a ontologia de feyerabend: pluralista, diacrônica, apofântica, empírica e democrática

tradução minha para a postagem de 02 de fevereiro de 2016, por terence blake, no seu blogue agent swarm.

Eu tenho examinado a filosofia continental recente em termos de 5 critérios de avaliação: pluralismo, diacronicidade, apofatismo, testabilidade e democracia. Para complementar essa análise eu gostaria de considerar o caso da filosofia última de Paul Feyerabend, como esboçada na sua correspondência, livremente disponível, com Isaac Ben-Israel, que ocorreu por um período de dois anos, se estendendo de setembro de 1988 a outubro de 1990.

(1) Pluralismo: Feyerabend é bastante conhecido por sua defesa de um pluralismo prático e teórico.

Mas poder-se-ia objetar que Feyerabend é um relativista e que a “pesquisa empírica” para ele poderia resultar em qualquer resultado que se deseje, porque no seu sistema “tudo vale” [anything goes]. Entretanto a melhor formulação para esse slogan polêmico é “tudo poderia funcionar (mas geralmente não funciona)” [anything could work (but mostly doesn’t)].

a realidade (ou o Ser) não tem estrutura bem-definida mas reage de modos diferentes a diferentes abordagens. Se abordado ao longo de décadas, por experimentos de uma complexidade cada vez maior, ele produz partículas elementares; se abordado de um modo mais “espiritual”, produz deuses. Algumas abordagens não levam a nada e colapsam.

(2) Diacrônica: por este motivo que Feyerabend às vezes recusa o rótulo de “relativista”, pois, de acordo com ele, “o relativismo pressupõe um quadro de referências fixo”. Para Feyerabend, a existência difundida de comunicação entre pessoas pertencentes a estruturas aparentemente incomensuráveis mostra que a noção de um quadro de referências que é fixo e impermeável tem uma aplicação apenas limitada:

pessoas com diferentes modos de vida e diferentes concepções da realidade podem aprender a comunicar umas com as outras, muitas vezes sem mesmo uma virada-gestáltica [gestalt-switch], o que significa, no que me concerne, que os conceitos que eles usam e as percepções que eles tem não estão resolvidas de uma vez por todas mas são ambíguas (32).

(3) Apofântica: Feyerabend distingue entre o Ser como realidade última, o qual é tanto indizível quanto incognoscível, e as realidades manifestas múltiplas que são produzidas através de nossa interação com ele, que são elas mesmas cognoscíveis. Aborde o Ser de um modo, ao longo de décadas de experimentos científicos, e ele produz partículas elementares, aborde-o de outro modo e ele manifesta os deuses homéricos:

Eu então distingo entre uma realidade última, ou Ser. O Ser não pode ser conhecido, nunca (eu tenho argumentos para tal). O que nós sabemos são as várias realidades manifestas, como o mundo dos deuses gregos, a cosmologia moderna etc. Estas são o resultado da interação entre o Ser e uma de suas partes relativamente independentes (32).

(4) Empírica: a diferença entre o pluralismo de Feyerabend e o relativismo é que nem todas as abordagens aos modos de existência são viáveis. Não há garantia que qualquer abordagem vá funcionar. O Ser é independente de nós e pode responder positivamente, o que frequentemente não é o caso.

Algumas abordagens não levam à nada e colapsam. De modo que eu diria que diferentes sociedades e diferentes epistemologias podem revelar diferentes aspectos do mundo, desde que o Ser (que tem mais de um aspecto) reaja apropriadamente (31).

(5) Democrática: Feyerabend conclui que a determinação do que é real e o que é simulacro não pode ser prerrogativa para uma ontologia abstrata e então de intelectuais que a promulguem.

Não há um quadro de referências fixo (diacronia), as realidades manifestas são múltiplas (pluralismo), o Real ou o Ser é incognoscível (apofantismo), e a experiência não pode preescrever nossa visão de mundo, mas pode excluir muitas cosmologias propostas (testabilidade).

Assim, a determinação do que é real depende da sua escolha em favor de uma cosmologia, de uma forma de vida ou outra, isto é, de uma decisão política. Isso leva Feyerabend a concluir:

uma epistemologia (mas o mesmo vale para a ontologia) sem política é incompleta e arbitrária (22).


postado em 15 de fevereiro de 2016, categoria reblog, tradução : , , ,

fantasma

em o senhor das moscas, william golding (alfaguara, 2014, p. 102), escreve:

“O problema é o seguinte, Porquinho. Fantasma existe? Ou monstro?”
“Claro que não.”
“Por que não?”
“Porque aí as coisas não iam fazer sentido. As casas, as ruas, e – a TV – nada ia funcionar.”
Os meninos que dançavam e repetiam seu refrão tinham se afastado, e afora o som que produziam era apenas um ritmo sem palavras.
“Mas e se elas não fizerem sentido? Não aqui, na ilha? Se tiver alguma coisa vendo tudo o que a gente faz, e só esperando?”

ali delineam-se os seguintes problemas:

  • o problema de não dominar a técnica.
  • o problema de não estar em presença da técnica.

mais adiante (p. 153), o complemento desses dois é exposto:

“Estou com medo.”
Viu Porquinho levantar os olhos; e continuou a falar, de maneira confusa.
“Não do mostro. Quer dizer, dele também. Mas ninguém mais entende como a fogueira é importante. Se você está se afogando e alguém joga uma corda. Se o médico diz que você precisa tomar um remédio pra não morrer – você aceita, não é? Quer dizer -“

  • o problema da alienação.

numa ilha, a reestruturação da técnica se dá com pinturas no rosto, cerco a porcos, cantigas em roda. selvageria do ocidente que regride a partir de si mesmo. no entanto, pensando numa sociedade em presença da técnica científica, a alienação do tipo “pedra mágica” (falta de domínio da técnica, falta de crença no todo que permite o domínio da técnica) permite também a coexistência da selvageria supersticiosa. se fosse uma letra de rock, o refrão que resumiria esse ponto seria:

from black box to magic stone, back to god.


postado em 24 de janeiro de 2016, categoria citações, livros : , , , , , , , , , ,

heidegger e a virilidade

o pau brocha: argumento heideggeriano contra o dildo.

“o próprio martelar é que descobre o manuseio específico do martelo” (o ser e o tempo, $15) e “a ferramenta está quebrada, o material inadequado. de qualquer forma, um instrumento está aqui, à mão” (idem, $16).

 


postado em 27 de outubro de 2015, categoria comentários : , , , , , ,

transversalismo

numa carta para michel cressole, autor de deleuze (eu não li), deleuze enfatiza a noção de transversalidade. parece sincero, tal como um adorno frente ao ativismo nas ruas: prefiro o grande hotel abismo. adorno também estava a praticar a transversalidade e hume diria que é de fato possível ter os mesmos efeitos por meios totalmente outros. frente à frente homossexual de ação revolucionária, o importante ainda é o importante – que cada um consiga aceitar sua própria solidão.

certo. mas então por que preciado insiste em chamar seu texto, no manifesto contrassexual, de a filosofia como modo superior de dar o cu? o que num momento irritado me permitiu escrever a um grande amigo “e depois, à lá deleuze, você diz que é devir-mulher ou então hermafrodita molecular. e eu como radfem-molecular digo que transversalismo é um grande engodo patriarcal.”


postado em 29 de agosto de 2015, categoria comentários : , , , , , , , , , , ,

teologia

1. existem mais deuses do que coisas.

2. para cada coisa, a probabilidade de que mais de um deus correspondente seja necessário, é muito grande.

3. a conquistada aparência de homogeneidade se dissipa frente a heterogeneidade complexa e abundante de causas últimas.

4. tales de mileto, o mesmo que disse da água, que ela era a causa material de todas as coisas (mas o que ele quis dizer por <água>?), também escreveu: “todas as coisas estão cheias de deuses”.


postado em 8 de maio de 2015, categoria comentários : , , , , ,

esquecimento

estava pensando numa postagem – ia chamá-la “dois sonhos”. só que simplesmente esqueci um dos sonhos. e fiquei assim encucado, esquecendo. ia ser uma postagem bem mais legal que essa. o que leva a comentar sobre o esquecimento. porque se o esquecimento fosse de fato um sumiço completo, ele não mostraria nem a ausência de algo e não poderia inclusive ser uma questão. como eu comentaria de um sonho que esqueci se tivesse esquecido que esqueci o sonho. e ainda assim, lembraria de alguma falta, algo que fica lá cutucado. penso nos pares – esquecer/lembrar, perder/encontrar. porque alertar alguém que este esqueceu de algo não é o mesmo que a sensação resultante de esquecer algo.


postado em 13 de março de 2015, categoria comentários : , , ,

grama

a grama dos outros é realmente sempre mais verde. a questão é saber se a melhoria em qualidade faz parte da gramática da palavra “outros” ou da palavra “verde”. comparem:

a. a grama dos outros (é mais verde).

b. a grama é verde (a dos outros).


postado em 9 de março de 2015, categoria aforismos : , , , ,

para além ou aquém

é o real.

{em anti-édipo, deleuze e guattari escrevem:

Isto porque o próprio inconsciente não é estrutural e nem pessoal; ele não simboliza, assim como não imagina e nem figura: ele maquina, é maquínico. Nem imaginário nem simbólico, ele é o Real em si mesmo, o “real impossível” e sua produção.

editora 34, 2010, p.75-6}


postado em 31 de julho de 2014, categoria aforismos : , , , , ,