na livraria de um simpático senhor para o qual o melhor livro já escrito é tuareg, de alberto vázquez-figeuiroa, no centro de belo horizonte, descubro que há uma compilação pós-morte de máximas de schopenhauer intítulada a arte de ser feliz. resolvo comprar, na certeza de encontrar logo no começo do mesmo a afirmação da impossibilidade real da felicidade. satisfeito, considero a máxima 36 representativa:
O meio mais seguro de não se tornar muito infeliz consiste em não desejar ser muito feliz, portanto em reduzir as próprias pretensões a um nível bastante moderado no que diz respeito a prazeres, posses, categorias, honra etc., pois a aspiração à felicidade e a luta para conquistá-la por si só já atraem grandes desventuras. A moderação, por sua vez, é sábia e aconselhável, porque é facílimo ser muito infeliz, enquanto ser muito feliz não apenas é difícil, como também é totalmente impossível.
de forma que a melhor opção de todas é estar sereno (que é uma qualidade que depende em 90% da sua disposição interna e não do mundo exterior), e estando sereno, apenas estar sereno: sem motivos. assim, descobrir o verdadeiro egoísmo, o egoísmo da dissolução sem esforço do eu. auto-ajuda.
após pagar, o livreiro me confidenciaria: “você sabe que a humanidade nos trouxe apenas dois filósofos. um deles foi platão. o outro…” e então olharia pro manualzinho em minhas mãos.
postado em 13 de abril de 2016, categoria crônicas, resenhas : arthur schopenhauer, auto-ajuda, felicidade, livraria van damme, serenidade
escreve ursula le guin, em a mão esquerda da escuridão:
(…) Lá fora, como sempre, a vasta escuridão, o frio, a solidão da morte.
Em tais momentos afortunados, enquanto adormeço, sei, sem sombra de dúvida, qual é o verdadeiro centro de minha própria vida, aquele tempo passado e perdido, no entanto permanente, o instante duradouro, o coração do calor.
Não estou tentando dizer que fui feliz durante as poucas semanas que passei arrastando um trenó por um lençol de gelo, em pleno inverno. Estava faminto, fatigado e muitas vezes ansioso, e tudo só piorou com o passar dos dias. Certamente não estava feliz. felicidade tem a ver com a razão, só pode ser conquistada pela razão. O que ganhei foi uma coisa que não se pode conquistar, não se pode manter e, muitas vezes, não se pode nem reconhecer no momento; falo de júbilo.
talvez isso explique o por quê de que, quando me perguntam se estou feliz, eu tenha que pensar.
postado em 19 de setembro de 2015, categoria comentários : a mão esquerda da escuridão, felicidade, gelo, inverno, júbilo, razão, trenó, ursula k. le guin
diz nietzsche em crepúsculo dos ídolos ou como se filosofa com o martelo, capítulo i., §33 (tradução de paulo césar de souza):
Quão pouco é necessário para a felicidade! O som de uma gaita-de-foles. – Sem a música a vida seria um erro. O alemão imagina até Deus cantando canções.
talvez o grupo les luthiers, em seu álbum volumen 3, tivesse lido o tal parágrafo ao elaborar seu romanza escocesa sin palabras.
postado em 29 de setembro de 2014, categoria comentários, excertos : crepúsculo dos ídolos, deus, felicidade, friedrich nietzsche, gaita de foles, les luthiers, romanza escocesa sin palabras