o não-amanhã

houve uma época em que antes de dormir me fazia a pergunta: e se eu não acordasse no dia seguinte? normalmente, quando não sentia grande apego à existência, quando deixar de ser e deixar de sentir ser poderiam ser equivalentes (no sono não-r.e.m., por exemplo), eu dormia bem.

david hume escreveu que a proposição “o sol não nascerá amanhã” é tão inteligível quanto a que considera que ele nascerá. mas com isso, não discursava nem sobre o sol, nem sobre a possibilidade de uma manhã na escuridão. alguns seres simplesmente somem.

ou melhor: a diferença de sumir e deixar de existir.


postado em 30 de junho de 2016, categoria comentários : , , , , ,

transversalismo

numa carta para michel cressole, autor de deleuze (eu não li), deleuze enfatiza a noção de transversalidade. parece sincero, tal como um adorno frente ao ativismo nas ruas: prefiro o grande hotel abismo. adorno também estava a praticar a transversalidade e hume diria que é de fato possível ter os mesmos efeitos por meios totalmente outros. frente à frente homossexual de ação revolucionária, o importante ainda é o importante – que cada um consiga aceitar sua própria solidão.

certo. mas então por que preciado insiste em chamar seu texto, no manifesto contrassexual, de a filosofia como modo superior de dar o cu? o que num momento irritado me permitiu escrever a um grande amigo “e depois, à lá deleuze, você diz que é devir-mulher ou então hermafrodita molecular. e eu como radfem-molecular digo que transversalismo é um grande engodo patriarcal.”


postado em 29 de agosto de 2015, categoria comentários : , , , , , , , , , , ,