na livraria de um simpático senhor para o qual o melhor livro já escrito é tuareg, de alberto vázquez-figeuiroa, no centro de belo horizonte, descubro que há uma compilação pós-morte de máximas de schopenhauer intítulada a arte de ser feliz. resolvo comprar, na certeza de encontrar logo no começo do mesmo a afirmação da impossibilidade real da felicidade. satisfeito, considero a máxima 36 representativa:
O meio mais seguro de não se tornar muito infeliz consiste em não desejar ser muito feliz, portanto em reduzir as próprias pretensões a um nível bastante moderado no que diz respeito a prazeres, posses, categorias, honra etc., pois a aspiração à felicidade e a luta para conquistá-la por si só já atraem grandes desventuras. A moderação, por sua vez, é sábia e aconselhável, porque é facílimo ser muito infeliz, enquanto ser muito feliz não apenas é difícil, como também é totalmente impossível.
de forma que a melhor opção de todas é estar sereno (que é uma qualidade que depende em 90% da sua disposição interna e não do mundo exterior), e estando sereno, apenas estar sereno: sem motivos. assim, descobrir o verdadeiro egoísmo, o egoísmo da dissolução sem esforço do eu. auto-ajuda.
após pagar, o livreiro me confidenciaria: “você sabe que a humanidade nos trouxe apenas dois filósofos. um deles foi platão. o outro…” e então olharia pro manualzinho em minhas mãos.
postado em 13 de abril de 2016, categoria crônicas, resenhas : arthur schopenhauer, auto-ajuda, felicidade, livraria van damme, serenidade
dois aforismas de nietzsche, que mandei para paula gontijo, para assim mandá-los a mim mesmo.
Humano, Demasiado Humano §61. SaberEsperar. – Saber esperar é algo tão difícil, que os maiores escritores não desdenharam fazer disso um tema de suas criações. Assim fizeram Shakespeare em Otelo e Sófocles em Ajax; se este tivesse deixado o sentimento esfriar por um dia apenas, seu suicídio já não lhe teria parecido necessário, como indica a fala do oráculo; provavelmente teria zombado das terríveis insinuações da vaidade ferida e teria dito a si mesmo: quem, no meu lugar, já não tomou uma ovelha por um herói? será uma coisa tão monstruosa? Pelo contrário, é algo humano e comum; dessa forma Ajax poderia se consolar. A paixão não quer esperar; o trágico na vida de grandes homens está, frequentemente, não no seu conflito com a época e a baixeza de seus semelhantes, mas na sua incapacidade de adiar por um ou dois anos a sua obra; eles não sabem esperar. – Em todos os duelos, os amigos que dão conselhos devem verificar apenas uma coisa: se as pessoas envolvidas podem esperar; se não for o caso, um duelo é razoável, pois cada um diz a si mesmo: “Ou eu continuo a viver, e então ele deve morrer imediatamente, ou o contrário”. Em tal caso, esperar significaria sofrer por muito tempo ainda o horrendo martírio da honra ferida, diante de quem a feriu; o que pode constituir mais sofrimento do que o que vale a própria vida.
Aurora §317. O julgamento vespertino. – Quem reflete sobre a obra de seu dia e sua vida, quando se acha cansado e no fim, normalmente chega a uma conclusão melancólica: isso não se deve ao dia e à vida, no entanto, e sim ao cansaço. – No meio da atividade geralmente não nos permitimos tempo para julgar a vida e a existência, e tampouco no meio do prazer: mas, se isso vem a acontecer, não mais damos razão àquele que esperou pelo sétimo dia e pelo repouso para achar muito belo tudo o que existe – ele deixou passar o melhor instante.
{ambas as traduções de paulo césar de souza para a companhia das letras}
postado em 18 de abril de 2015, categoria excertos : aurora, auto-ajuda, friedrich nietzsche, humano demasiado humano, o julgamento vespertino, saber esperar