há algo de profundamente romântico na visão de william gibson sobre uma certa categoria de personagens. o artista como acontecimento precisa estar tão imerso no fazer a ponto de não se importar com a obra, com as conexões, com a difusão. ele é um agente da vontade, uma força da natureza: um robô lixeiro, uma menina cataléptica. ali, há uma confluência entre imagens do inconsciente, outsider art e o capital. é como se nise da oliveira tivesse de operar clandestinamente; teríamos acesso apenas a raros quadros misteriosos, aqui e ali. mas não temos o ponto de vista do artista – apenas do capitalista que quer caçar esse tesouro vivo – a intencionalidade cujo elemento humano é sublime – ao mesmo tempo nosso e estranho. sedutoramente estranho. pois haverá muitos a sonhar com a esquizofrenia, o robô lixeiro, a catalepsia.
[dos rascunhos, janeiro de 2013]
postado em 13 de setembro de 2024, categoria comentários, livros : acontecimento, gênio, william gibson
eu peço um taxi para j.-p. caron e sanannda. esta deve ir à curitiba. jean vai para o rio, horas mais tarde (aconselhei ele a passear pelo minas shopping, circuito-metrô). o taxi chega 19h08, o que é um bom horário. o ônibus sai 19h45.
levamos as malas, teclado, pratos, mochilas e ferragem para o porta malas. sanannda é isignificanto e no dia anterior havia viajado 15h a fim de se apresentar no bhnoise 2015. agora era voltar. mais 15 horas. ela tem compromissos e só há um ônibus por dia de cá para lá.
jean me pergunta se deve deixar a porta aberta. estou carregando coisas e não entendo direito. ele repete a pergunta, e quase que repete de novo: “deixo aberto?”. na insistência, falo rapidamente “deixa” e se o rufo sair, sei que rapidamente voltará para dentro, de modo que eles começam a carregar o porta malas e rufo, o boxer de 7 anos de idade que mora comigo, faz xixi nas árvores mais próximas.
peço para ele entrar; ele não o faz. creio que está excitado com os novos amigos que vão embora. mas é hora da despedida, o tempo urge e peço que jean e sanannda vão, já está na hora, adeus, tchau rufo, tchau henrique, o taxista esperando já com o taxímetro ligado.
mas quando jean abre a porta não é ele que entra e sim rufo, que matreiro, pula na frente dele e senta no banco de trás. todos perplexos, olhamos para o cão que parece obstinado a dar uma volta de carro. e não é que ele empacou mesmo? rosna e tenta me morder. chamados, broncas, coleira para passear, comida e depois um bife, e nada. meu telefone está pifado. corro até um ponto de taxi próximo, enquanto sanannda e jean descarregam e rufo, que fora empurrado, agora senta-se confortavelmente na poltrona do co-piloto.
um taxista me ignora, o que parece ser normal em belo horizonte. o único que está no ponto, está mexendo na lanterna, impassível. corro de volta. peço pro taxista chamar um outro. tensos com o horário, jean e sanannda estão bolados. no fim, o outro taxi chega e graças a impontualidade rodoviária, sanannda consegue entrar no ônibus do dia.
enquanto isso o taxista liga para anderson e louisa. eles estão longe. penso em deixar rufo me morder, se for o caso. anderson e louisa sugerem coisas e parece que rufo já está mais amigável. anderson me lembra de alguns dos medos do cachorro e fala sobre andar de carro com ele. com cuidado, sento do lado dele, exprimido no copiloto, e com o portão de casa aberto, entramos. rufo fica incomodado e eu abro a porta. leva um tombo, mas tão logo se levanta corre e come o bife. depois, fica pra lá e pra cá na casa, todo contente. pago R$18 ao taxista. peço desculpas mas ele diz que está tranquilo de limpar, com um paninho.
***
interpretação cosmológica: uma questão, repetida, reforçada, altera o estado do mundo a fim de receber uma resposta unívoca por parte deste. a resposta envolve uma determinação negativa; ela chega apenas depois e quando responde, dissolve o próprio problema, originando assim um acontecimento.
interpretação panpsíquica: o cachorro, percebendo a brecha que se lhe abria, recolhe-se no verdadeiro momentum de de nomadismo, e viaja sem deslocar-se. enquanto isso, o taxista recolhe a mais valia.
postado em 23 de outubro de 2015, categoria crônicas : acontecimento, carro, nomadismo, passeio, rufo, taxi, taxista
passo dias a esperar o imprevisto. quando canso, desisto
e então ele acontece: improviso.
postado em 18 de novembro de 2012, categoria Uncategorized : acontecimento, imprevisto, improviso, poemas
certos eventos são surpreendentes. mas só o são porque <foram>. e se assim foram, é porque estavam fora do pensável; mas não mais, e então pedem cautela futura, precaução – estratégias para afunilar o possível: “isso não vai ocorrer mais”. estas, por sua vez, falham novamente. os eventos são outros, a precaução versa sobre classes, tipos e procedimentos – a surpresa vêm de acontecimentos: nos lembram <a espiral>, em movimento assintótico. o centro é um limite, esse limite é um horizonte, esse horizonte é aquilo que pretendemos olhar quando caminhamos para frente: mais e mais controle.
da surpresa: ela sussurra, mas só <depois> entendemos: “não tem fim: isso é apenas um <meio> de levar as coisas”.
postado em 30 de abril de 2012, categoria Uncategorized : acontecimento, evento, filosofia, imprevisto, pensamento, supresa