CRS 2015 #4: O Menino e a Folha de Capim

O homo faber envelhecido só toca stradivarius. É preciso, portanto, rejuvenescer os quadros. Vamos escutar um menino que apanhou uma folha adequada, espicha-a entre as suas duas palmas e agora a sopra, enquanto o côncavo das suas mãos lhe serve de ressonador…ele escolheu, por sua própria conta, entre as fontes de sons, uma que lhe parecia das convenientes à sua atividade. Com efeito, esse menino experimenta os seus sons uns após os outros, e o problema que ele coloca é menos o da identificação do que o do estilo de fabricação. Por outro lado, a sua intenção é visivelmente ‘música’. Se o resultado não parecer musical aos seus ouvintes exasperados, não se poderia negar ao autor uma intenção estética, ou pelo menos uma atividade artística…O seu objetivo é gratuito, senão gracioso; confessêmo-lo, ele é mesmo musical. Não satisfeito em emitir sons, ele os compara, ele os julga, acha-os mais ou menos bem sucedidos, e a sua sucessão mais ou menos satisfatória. Como havíamos dito do homem de Neanderthal, se esse menino não faz música, quem a faz então?… O que escuta então o ouvinte, mesmo negligente, mesmo reticente, mesmo hostil? Por um momento – o que não é de hábito – objetos sonoros…O nosso ouvinte ficará limitado a suportar uma coleção de objetos desprovidos de sentido musical…Obrigado a escutar, pois os objetos são agressivos, ele formará, implicitamente julgamentos de valor. Chegará até a murmurar…: ‘Eis aí um mais bem sucedido que os outros’…Não se escuta mais o som pelo evento, mas o evento sonoro em si mesmo.

Comentamos em sala de aula sobre esse pequeno trecho de Pierre Schaeffer, do livro Traitée des objects musicaux (Tratado dos objetos musicais), traduzido por Rogério Costa. Alguns acadêmicos gostam bastante dele e escreveram artigos sobre. Acho Músicas e Territórios, de Silvio Ferraz, um texto compreensivo sobre o assunto.


postado em 27 de abril de 2015, categoria oi kabum bh : , , ,