2012-11-04 henrique iwao – sangue de máquina
postado em 16 de novembro de 2012, categoria Uncategorized : apresentações, casa azul, incômodo, máquina, sangue, sangue de máquina, solo
alguns devem ter-se perguntado seriamente sobre porque não há grandes feitiches da viagem no tempo quando se vai ao futuro. para todos os que não pararam para pensar sobre isso aqui vão três exemplos. espero que a leitura destes possa tornar clara a inutilidade do tipo de empreendimento que descrevem.
1. um sujeito vai ao futuro para assistir à sua propria morte. quando morre, pensa: “a morte é justamente onde eu não estou, mas cá estou”. alternativamente: “há vida após a morte, só que não após a segunda morte”, ou “o gato morre sete vezes, e eu duas”.
corolário: se é concedida a possibilidade disso, então fica indicado o fato dos gatos viajarem para o futuro.
2. um sujeito vai ao futuro assistir a sua morte. quando se empolga e comete a atrocidade, diz não poder ser preso por assassinato. na verdade se trata de suicídio doloso.
3. imagine-se viajando no tempo para o futuro com uma máquina portátil, com o objetivo de pentelhar-se por todos os dias de sua própria vida. convence-se, após pentelhar-se por um dia inteiro, a viajar para o dia seguinte e pentalhar-se por um dia inteiro, convencendo-se a pentalhar-se no dia seguinte por um dia inteiro etc.
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explicações: se ainda não entendeu onde deve-se chegar, leia abaixo.
1a. o sujeito chega no horário e local previsto pela cartomante para sua morte, afim de presencia-la em vida. só que daí morre.
1b. o sujeito chega no horário e local previsto pela cartomante para sua morte, só que não há ninguém lá. a cartomante sabia disso e enganou-o por um bom bocado. isso porque, justamente, ao viajar no tempo para o futuro, ele viajou no tempo para o futuro (e não envelheceu).
2. mesmas ressalvas a 1, com a adicional de que se suicidar é crime grave e inafiançável na maioria dos países do mundo.
3. pense sobre o propósito disso. faça um diagrama. não é muita estupidez?
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corolário ortografia: eu escrevo feitiche com esse “i” antes do “t” mesmo. algumas pessoas tem me indicado que isso é errado, mas eu falo com o “i”.
corolário futuro encontro: enquanto é fácil se encontrar no passado, no futuro isso não é tão simples. o modo mais garantido é voltar ao passado e se convencer a não voltar para o passado. aí sim, viajar ao futuro, e se encontrar mais velho. isso pode ser paradoxal, mas não chega a ser um feitiche.
corolário assassinato: voltar ao passado afim de se convencer a não voltar ao passado para ver sua própria morte no futuro pode ser problemático, especialmente se o caso for o do ponto 2. afinal, você não quererá ser morto, a menos que já seja suicida. se assassinar (ou suicidar-se-a-si-outro) no futuro não chegará nunca a ser tão emocionante quanto comer-se-enquanto-bebê no passado.
malin Bång http://www.malinbang.com/
bernhard gander
encontrei o conteúdo abaixo anotado em um arquivo de nome communication.txt em uma pasta escrita backup, dentro da minha pasta de “vídeos meus”.
1. we can group objects according to the actions we may perform with them, but not according to supposedly intrinsic qualities.
2. gravity takes all.
3. sound-image coupling in a video is completely arbitrary. truthfulness in this is not a “natural phenomena” but mere habit.
suponho que eles sejam extrapolações feitas a partir desse vídeo abaixo. ele foi publicado na revista casuística, no. 02, em fevereiro de 2012.
um dos grandes prazeres imaginados quando da execução dos feitiches da viagem do tempo é da ordem do paradoxo lógico. espera-se que o sentimento de estar acomentendo algo paradoxal, acoplado ao fato de estar-se autoinflingindo esse paroxismo, potencialize tanto o coito com a (não-mais)-progenitora (ou o equivalente masculino, se você for mulher), quanto as bocanhadas de carne assada, bife etc, de (não-mais)-você-quando-bebê. no caso do sexo, não apenas o pensamento “estou causando um puta paradoxo lógico”, mas o esperado sentimento de se perceber justamente como o ponto focal daquele paradoxo (o que supostamente aumentaria em muito a virilidade).
contra essas especulações, no que concerne o primeiro feitiche, douglas adams escreve, em o restaurante no fim do universo (sextante, 2004, cap. 15):
“não há nenhum problema em tornar-se seu próprio pai ou mãe com que uma família de mente aberta e bem ajustada não possa lidar.também não há nenhum problema em relação a mudar o curso da história – o curso da história não muda porque todas as peças se juntam como num quebra-cabeças. todas as mudanças importantes já ocorreram antes das coisas que deveriam mudar e tudo se resolve no final.
o problema maior é simplesmente gramatical, e a principal obra a ser consultada sobre esta questão é o tratado do dr. dan streetmentioner, o manual das 1001 formações de tempos gramaticais para viajantes espaço-temporais. nesse livro você aprente, por exemplo, como descrever algo que estava prestes a acontecer com você no passado antes que o acontecimento fosse evitado quando você pulou para a frente dois dias. (…)
a maioria dos leitores chega até o futuro semicondicionalmente modificado subinvertido plagal do pretérito subjuntivo intencional antes de desistir. (…)
o guia dos mochileiros das galáxias passa levemente por cima dessas complexidades acadêmicas, parando apenas para notar que o termo ‘pretério perfeito’ foi abandonado depois que se descobriu que não era assim”.
uma teoria alternativa versa que toda vez que voltamos ao passado, criamos um universo paralelo, de tal modo que a comermo-nos-enquanto-bebês situamo-nos imediatamente em um universo em que não-nos-somos-enquanto-bebês, de tal modo que também não sentimos o paradoxo do tempo senão como a mera expectativa de senti-lo (o que, no entanto, parece ser suficiente para o feitiche).
ilya prigogine, em as leis do caos (editora unesp, 2000) defende que o tempo possui uma seta sempre para frente, ou seja, que é irreversível.
1. voltar no tempo e casar com a sua mãe, antes dela conhecer o seu pai (ou o contrário, se você for mulher).
2. voltar no tempo, raptar você mesmo quando bebê e comer-se.
por razões que devem ser evidentes àqueles que pensaram sobre o assunto, não há grandes feitiches para viagens no tempo para o futuro.
programa de radio massacríca, coordenado por leandro nerefuh. mobile radio bsp, um projeto de knut aufermann e sarah washington, na 30ª bienal de arte de são paulo. 2012-10-18, 14h às 16h: conversa sobre colagem musical, pilhagem sonora, novos instrumentos & maquinações com alexandre marino, eduardo nespoli & henrique iwao. participação especial de knut aufermann.
pode ser baixado via torrent ou acessado aqui, no archive.org.
dia 27 de outubro de 2012, a partir de por volta das 14h houve um concerto do nme, nme8, na praça do côco, campinas. fui o último a me apresentar. toquei um improviso, com cerca de 20 minutos de duração.
henrique iwao: máquinas fotográficas, piezo, gravador portátil (voz de j.-p. caron e outra), gravações realizadas em alter do chão (pará), laptop.
o padrão de intensidade fonográfica hodierno (de gravações de música e sons diversos) segue ainda o imperativo: “cada vez mais alto – se a média for a máxima, então…”.
esses três pontos me preocupam: o costume certamente leva à perpetuação dele mesmo. mixo alto porque estou acostumado a ouvir um som homegeneamente alto, porque outros se acostumaram a mixar homogeneamente alto etc loop. compressão.
estava dentro. variações entre um som baixo e um som ensurdecedor. estava gravando, na casa azul, para documentação da audioinstalação / intervenção sonora / performance. isso, dia 24 de outubro de 2012. dia 25 paro uma horinha para mixar o som. parece baixo. aumento. um trecho intenso, muito. doem meus ouvidos (não é bom). lembro que estou com fones.
me ocorre possivelmente haver uma relação forte entre compressão, fones de ouvido e o paradigma de mixagem, quanto à intensidade.