Jams de Dança do CCSP, Abril de 2009

Nos dias 07, 14, 21 e 28 de abril de 2009, participei, a convite de Lara Pinheiro, do projeto Jams de Dança do CCSP. Os encontros ocorreram na sala Adoniran Barbosa, Centro Cultural São Paulo, localizado próximo ao metrô vergueiro, das 12h30 às 14h.

“Fruto do projeto jam de dança, que aconteceu durante o ano de 2008, a proposta central do encontro de dança e música é reunir artistas do corpo (coreógrafos, performers e dançarinos) e músicos de diferentes vertentes para experimentar, em tempo real, a criação em dança. Sempre tendo os artistas participantes como mediadores e coordenadores, o público poderá entrar em cena e contribuir com seu material corporal (90min, livre)” [descrição do site do CCSP]

jam ccsp 28 abril (33)

Eu, que já vinha participando do evento como público dançante, agora estava muito contente de poder contribuir como artista coordenador músico. Resolvi então formar duos de improvisação, cada dia com um colega diferente, de modo a trazer como um desafio sempre novo a construção da relação entre música e dança, som e movimento. A escalação final ficou:

Dia 07: Henrique Iwao & Pan&Tone.
Dia 14: Henrique Iwao & Lucas Araújo.
Dia 21: Henrique Iwao & Valério Fiel da Costa.
Dia 28: Tipografia (Henrique Iwao & Matheus Leston).

jam ccsp 14 abril (9)

A coordenação de dança ficou a cargo de Miriam Druwe e Thiago Negraxa, exceto no dia 21, em que Tatiana Guimarães substituiu Miriam.

Fotos completas podem ser vistas em meu Flickr.

Para tocar com Pan&Tone (Cristiano Rosa) levei poucos instrumentos; estava levemente instável emocionalmente e deixei isso afetar minha performance. Nesse primeiro encontro, Miriam e Thiago nos deixaram nervosos, por interferirem em aspectos sonoros, falando, cantando ritmos, e sugerindo que nós mudássemos o que estávamos fazendo. Ficamos um pouco abatidos e não soubemos contornar muito bem esse nervosismo. Pan&Tone gostou de um pulso grave produzido por um de seus instrumentos (o Piá), e o manteve durante quase 50 minutos! O resultado foi uma improvisação seca e sem grandes contrastes, com algum estranhamento por parte daqueles que dançavam. Quando a coisa parecia deslanchar ou mudar (quando Cristiano foi tocar trompete por exemplo), se acanhava de novo.

Isso tudo não deixa de ser bom, não é mesmo? Nem tanto, mas também, a experiência serviu para desenvolver uma importante estratégia para os outros encontros: as improvisações devem ter seções claramente distintas e diferenciadas pelos timbres utilizados.

Afora isso, escrevi a todos falando sobre a experiência e Miriam bem respondeu: “não se preocupe, estamos nos conhecendo (…). Eu adorei o som”.

Miriam conduz sempre aquecimentos longos, as ações são faladas em um microfone. A música pode calmamente fluir junto com essas palavras, enquanto os corpos vão se preparando. Não obstante, é difícil para um músico como eu – acostumado aos sons sem significante – ouvir tantas palavras, palavras comunicativas, evocativas…

Lucas Araújo tem um hábitos curiosos, um deles é querer determinar, de antemão, as durações de seções de uma improvisação, sem necessariamente querer determinar mais nada. Ele anota – tantos minutos, dividido por tanto, igual a tanto – e enquanto toca seu baixo elétrico, vai espiando no relógio. Isso garante que existam grandes blocos formais diferenciados, e para corroborar nesse sentido escolhi uma sequência de fontes sonoras para mim: piano, computador, caixa clara & voz de robô, computador, piano. Também preparei algo para Thiago, pequena seção não improvisada de grooves gravados. Miriam incorporou objetos à improvisação, e os participantes deram poética aos mesmos. Durante um bom tempo, no final, Lucas atuou como sonoplasta de alguns movimentos, arrastando um pequeno microfone de contato em uma mesa. Eu então testei soltar samples de sons da minha casa, em ritmos quebrados, semi-tropeçados.

Nesse dia, o público cativo de Valério Fiel da Costa compareceu, e como não dançavam, ficaram olhando e escutando, o que, para o que foi feito, não deixou de ser uma experiência incompleta. Não estávamos lá para fornecer um concerto, a tensão necessária para um concerto é outra; a improvisação com dança parece propor algo a princípio menos denso, que deixa frestas entre os sons para os movimentos fluirem, que capta alguma ação e se deixa levar, que negocia vontades e desejos alheios.

Como era feriado e o tempo estava ruim, poucas pessoas compareceram, apenas 3 dançaram, afora os coordenadores. Não gostei do modo como Tatiana utilizou o microfone – para ela, um meio de expressão: crescendos e acelerandos terminando em grito, e repetições ofegantes. Suas intervenções não dialogavam bem com os sons que nós produzíamos, por serem muito auto-centradas e estarem sempre mais intensas do que o que produzíamos. A responsabilidade, no entanto, era tanto minha quanto dela: eu poderia ter conversado, pedido para diminuir o volume, etc. Aparentemente, essa opinião minha fez-se mais efetiva apenas quando ouvi a gravação em áudio do evento, danificada em vários trechos pelos gritos, excessivamente altos para minhas regulagens.

jam ccsp 21 abril (25)

Gostei muito de vários trechos da improvisação, Valério produz seus drones acústicos amplificados; fiquei inspirado e toquei algo no piano muito bom (com espírito jazz, nos graves). Infelizmente, o pessoal do CCSP não permitiu que nós preparássemos o piano, apesar do Valério ser especialista nesse tipo de coisa. Soou como pirraça, dado que duas semanas depois, Lívio Tragtemberg tocaria o mesmo piano, todo preparado.

Houve um momento em que meu ex-colega de Centro Acadêmico (2003), Felipe, sentou ao meu lado e quis tocar pandeiro ritmadamente, o que musicalmente, ao meu ver, não procedia. O som, na improvisação musical, é mais presente para todos, do que o movimento na improvisação de dança. Quando se está preocupado, como eu, em criar bons resultados, dentro de um âmbito específico (isto é, tocando com o valério em uma jam de dança), fica difícil ou até mesmo indesejável abrir espaço para alguém que muito provavelmente vai tocar ritmos em um pandeiro. Essa visão acabou por gerar um clima ruim entre mim e Felipe, infelizmente.

Corolário: burocratas do CCSP tinham dito para mim que nenhum músico poderia tocar no evento sem assinar um contrato, por razões legais, e que eu não poderia de modo algum chamar músicos extras para tocar comigo…

Para tentar conferir ao aquecimento um valor integrado ao som do Tipografia, Leston produziu loops com trechos de sons da voz de Miriam (estávamos torcendo pelo seu joelho).

Organizamos a performance como uma série de números musicais, baseados em materiais que coletamos e em programas e funções de computação que possuíamos. Assim, foi de longe a apresentação menos improvisada do mês (os blocos e forma eram pré-definidos). Tentamos alternar trechos ritmicos e texturas, pedais.

Destaque para giros sob uma base retirada da Sagração da Primavera, de Stravinsky (uma das canções mais dançantes, não?), com gestos sonoros do filme Tron. Destaque negativo vai para a inserção de trechos de canção em Ré grunge, ao final, quando ninguém parecia estar disposto a algo com som alto e ritmado. Lembro que a minha decisão em colocar o trecho foi baseada no desejo de encobrir os sons do piano, horrivelmente tocado por alguém do público. Para alguém entrar na onda, precisei deixar durante um tempo considerável o grunge grunge.

Outra filmagem dessa ocasião foi postada por Leston aqui.


postado em 5 de março de 2010, categoria dança
  1. Mel-Momentum disse às 17:56 em 6 de abril de 2013:

    Otimo relato e arquivo to evento!
    🙂