Quando a escola de arte e tecnologia Oi Kabum! BH encerrou suas atividades em 2016, eu, Débora Braun, Diana Castilho e Leonardo Mascarenhas ficamos de escrever, a partir dos textos e documentos produzidos pela equipe da escola, uma revista. Ela está agora disponível. Contém material sobre a metodologia da escola, a matriz curricular, a equipe e gestão escolar, o processo seletivo, o núcleo de produção, além de proposições dadas em sala de aula. Aspectos importantes de nossa prática são abordados, como
a preocupação com processos de avaliação que fossem próximos aos educandos,
o desenvolvimento gradual de uma gestão tão participativa quanto possível,
a importância da motivação como motor do aprendizado,
a predileção para o aprendizado ligado à resolução de problemas,
a valorização de habilidades envolvidas em trabalhos coletivos,
o estabelecimento da orientação como espaço pedagógico regular,
a ideia do tempo livre,
o fomento à atividades extra-classe de diversas naturezas (estágios, encontros, clubes de aprendizado, grupos de estudo, festas, assembléias, mostras, shows).
Oi Kabum! BH: Experimentações Pedagógicas em Arte e Tecnologia (ISBN: 978-65-00-93785-5) pode ser lida no issuu da extinta escola, ou baixada no meu servidor ou ainda aqui, no archive.org. A revisão foi feita por Flávia Peret e a diagramação e arte gráfica por Kawany Tamoyos, usando imagens do acervo digital da escola.
José Vitor perguntou sobre referências de paisagem sonora e gravação de campo.
Hildegard Westerkamp é possivelmente a maior referência do gênero (um exemplo aqui – ela usa gravações de campo como material para uma arte que procura sensibilizar sobre a paisagem sonora mundial e a escuta).
Thelmo Cristovam fez as fotofonografias, gravações de campo acompanhadas de foto. Renata Roman começou a fazer gravações que procuravam mapear São Paulo, em SP Sound Map.
Michael Pisaro tem inúmeros trabalhos. Lembro aqui de Transparent City, que são 24 gravações em Los Angeles, de 10 minutos em locais específicos, separadas por silêncios (são 4 CDs). As gravações são misturadas com sons eletrônicos simples, do tipo senóide.
Jacob Kirkegaard – 4 rooms (quatro salas), em que faz processos de retroalimentação em lugares radiotivos de Chernobyl.
Peter Ablinger gravou na série Branco/Brancura (Weiss/Weisslich) sons de folhas de árvores específicas balançadas pelo vento. A história é que era muito difícil fazê-lo sem pegar outros sons. No livro diz que para certas árvores ele ficou horas para gravar 40 segundos de som ininterrupto.
Meu selo lançou dois álbuns que têm a ver. Marco Scarassatti, Rios Enclausurados: cartografia sonora de rios concretados na cidade de Belo Horizonte, algumas vezes inclusive de dentro dos bueiros (entrevista aqui). Cidade Arquipélago, de Paulo Dantas (é legal baixar, porque tem infos legais no encarte), com gravações de som binaurais (com microfones dentro do ouvido) de lugares no Japão.
No GG Pesquisa do primeiro semestre de 2015, visitamos o Plug Rango e fizemos entrevistas com a nutricionista de lá. A ideia inicial era publicar os dois textos abaixo numa zine do grupo de gestão, mas a coisa se enrolou.
***
Preâmbulo: Visita ao espaço do Plug Rango
Mas e o Plug Rango? O mistério dos saquinhos com comida… Como funciona o maquinário? E o espaço deles, o que será que tem lá dentro? Estávamos curiosos e agendamos uma visita à cozinha com a nutricionista Claudiane, da Prudente Refeições. Nesse dia, ela e Raquel (também da Culinária) nos receberam e foram bastante cordiais.
Primeiro, existe toda uma logística – saber o número de refeições, estipular cardápios; assim dá para saber com antecedência o que precisa ser comprado e quando. As verduras e frutas chegam em caminhões e caminhõezinhos, em uns caixotes de madeira. São separadas e guardadas então em caixotes de plástico, diminuindo a possibilidade de que insetos fiquem por ali. Antes da preparação, as verduras são mergulhadas em um produto biodegradável, o que alguns fazem em casa com a água sanitária. Depois são lavadas. Tem umas máquinas de cortar em quadradinhos, bastante curiosas, tipo aqueles de alho, mas em tamanho gigante.
A cozinha está sempre com muita água no chão, por isso aqueles ralos por toda a parte. Eles já vão cozinhando e lavando pra ir pra próxima etapa. Os fogões são gigantes – um especialmente para fazer arroz, e outro para feijão. Com um fogão daqueles, dá até para fazer 160 kilos de arroz de uma vez só.
A carne tem uma coisa à parte: ela chega congelada e vai para freezers desses que a gente usa nas festas para guardar sorvete. Então, 3 dias antes da refeição ela vai para uma grande sala refrigerada, e fica lá, lentamente descongelando. Parece que assim existe menos chance de contaminação, se a carne vai descongelando lentamente. Aliás, para entrar nessa sala gelada e vedada, tem que colocar um casaco – o casaco fica ali do lado, num cabide, esperando. Elas falaram no risco de pneumonia, com o choque térmico de entrar despreparado.
Outra coisa sobre a carne: ela é cozinhada no vapor, sem óleo. A máquina parece um televisor de cachorro, mas mais alto e com vários andares de bandejinhas. Claudiane falou algumas vezes sobre isso – usar menos óleo (nesse caso específico – nenhum) e temperar apenas com o básico – sal e alho.
Na parte da lavagem, ali perto da saída, tem uma máquina de esterilização. Também tem uma sala para estocar a seco alimentos (que disseram, todos de qualidade comprovada por órgãos responsáveis) e uma outra, refrigerada, para estocar lixo e restos de comida. Se não tudo ficaria não apenas mal cheiroso, mas com riscos de proliferação de bactérias. Tem o dia de coleta do lixo, então até lá, deixam os dejetos descansando.
Evitar contaminação alimentar: essa parece ser a grande preocupação deles. Mostraram serem cuidadosos com a questão do higiene. E os saquinhos? Caso ocorra, por azar, alguma suspeita de intoxicação alimentar – esses saquinhos podem ser analisados. Por exemplo: alguém passa mal ontem, mas só descobrem hoje e querem ver se foi por causa da comida. Então tem os saquinhos da refeição de ontem guardados para análise. Isso permite entender e verificar problemas eventuais.
Depois dessa visita, queríamos fazer uma entrevista. Elas pediram para responder por e-mail. Mandamos então uma leva de perguntas, e depois de recebermos as respostas, mandamos mais uma. Queríamos respostas mais específicas! Só que com os preparativos pro Plug-aiá, o tempo ficou corrido pra elas.
Ps: nosso objetivo não era criticar o Plug Rango, mas entender como funciona, e quais dificuldades eles enfrentavam no preparo, principalmente do almoço. Nesse processo, acabamos esquecendo de falar e conversar sobre o lanche, que é muito mais controverso… Fica para uma próxima.
Henrique Iwao, junho de 2015.
////
Fizemos uma visita ao Plug Rango com a finalidade de entrevistar a nutricionista e saber um pouco mais sobre como funciona a alimentação do refeitório. A quantidade produzida de comida diariamente é de 500kg para o almoço. Esse cálculo é feito com base no número de pessoas que está programado para almoçar lá, e também por um acompanhamento médio do consumo diário das pessoas. O consumo no refeitório é livre, com carne e sobremesa porcionadas.
Opções vegetarianas
Segundo a nutricionista, a opção vegetariana usada hoje em dia é ovo, devido à preferência da maioria dos alunos. Eles já tentaram outras opções à base de soja, mas não foram bem aceitas gerando muito desperdício. Opções como grão de bico e lentilha, que são feitas com maior frequência, são mais bem aceitas.
O Grupo de Pesquisa da Kabum pergunta: por que não testar outras opções vegetarianas? Por que não fazer uma pesquisa no Plug para saber o número de vegetarianos e suas preferências?
Temperos
Ficamos felizes de saber que a carne é feita a base de vapor, com pouco uso de óleo! O tempero mais usado é alho in natura (ótimo para a saúde!) e sal. Mas às vezes eles utilizam temperos industrializados, como caldo de galinha e carne, para realçar o sabor da comida. Esses temperos industrializados não são nada bons para a saúde…
O Grupo de Pesquisa da Kabum pergunta: por que não usar apenas temperos naturais?
Curiosidade mineira
Eles procuram inserir no cardápio preparações que remetem à cultura mineira, como feijão tropeiro, tutu, frango com quiabo, macarrão e carne moída com polenta.
a série 100 comédia, (o volume 1 é esse? certo). existe uma versão brasileira? talvez sim, como comentada aqui.
do documentário pixo, mais focado na cena de são paulo.
há um trabalho feito atrás da estação central que seria legal visitar.
tentamos ajudar jéssica a elaborar um roteiro, com a ideia de “realidade profunda” ou ainda “mundo digital paralelo”. num brainstorm (tempestade cerebral), citamos:
senhor ninguém, filme de jaco van dormael (2009)
matrix, filme dos irmãos wachovsky (1999)
existenz, filme de david cronenberg (1999)
sword art online, animê de reki kawahara, cuja descrição me pareceu similar em aspectos ao jogo do existnz (2009).
tron, filme de steven lisberger, onde sujeito fica preso dentro do jogo (1982).
caverna do dragão, série animada, de 1983-6, em que jovens se vêem presos dentro de um jogo (poderíamos então pensar também no filme jumanji, de joe johnston (1995)).
waking life, filme de richard liklater (usa videopintura?) e que questiona o que é a realidade, e tem efeitos que misturam visualidades 2D e 3D (2001).
show de truman, filme de peter weir (1998).
o homem do futuro, filme de cláudio torres (2011).
algum filme com um menino e um guarda-chuva (?).
ponte para terabítia, de gabor csupó (2007).
um conto do h.p. lovecraft sobre nunca acordar de um pesadelo: a coisa no luar (1927)
falamos sobre as músicas e os lugares. que música toca em qual loja, em qual ambiente; qual a relação da música escolhida com o ambiente (na casa, na rua, etc). vimos um documentário com trilha do henrique iwao, coleção e museu, de dalton sala.
aula 2
rafael trouxe uma coletânea de trilhas, de hironobu sakaguchi, dos jogos da série final fantasy. discutimos sobre música de videogames antigos, 8 bits (chiptunes), com poucos canais / vozes independentes. depois gustavo lembrou do site ongaku concept.
pensamos na ideia de filme de si mesmo e trilhas para situações cotidianas, e momentos em que nos imaginamos dentro de um filme.
lemos trechos do livro “carne de canhão”, de agustín arosteguy, acompanhados das músicas que ele sugere nos inícios de capítulos.
aula 3
exercício de escrita de cena e elaboração de trilha para esta.
aula 4
exercício: escolher um texto e realizar trilha para este.
vimos o trecho inicial (0:00 a 4:30) do filme paranoid park, de gus van sant, trilha de ethan rose – “song one”; vimos também um trecho (32:20 a 37:24) do filme kwaidan:4 faces do medo, de masaki kobayashi, trilha de toru takemitsu. primeiro sem som, depois escolhendo sons e músicas diversas e depois com a trilha original.
aula 5
falamos de leitmotif, ou tema-guia, conceito usado por richard wagner para compor suas óperas. vimos como, muitos anos depois, o mesmo foi utilizado por john williams na trilha da primeira trilogia guerra nas estrelas. comentamos as aparições do “tema da força“.
tangentes: filme liztomania, de ken russell. autores de teoria crítica – theodor adorno critica a indústria cultural; guy debord e a sociedade do espetáculo.
ao final, ouvimos um trecho de also sprach zaratustra, poema sinfônico de richard strauss baseado no livro de friedrich nietzsche.
mais puxado para uma espécie de surf rock sem praia (então, de videogame): retrigger. conversamos também sobre o início da música eletrônica – a chamada música concreta (pierre schaeffer e pierre henry, este último, “o avô da música eletrônica”).
aula 7
ouvimos os exemplos desenvolvidos na aula 6:
falamos do por quê de representar o relógio como um tic-tac e não um tac-tac, e afinal, porque o tempo passa assim, regularmente, como um tempo sempre acabando? um exemplo inusitado – e aqui fizemos o exercício de poder levar tudo a sério. floribella.
a dicotomia entre o bom e o mal: exemplos de anjos e demônios / música angelical e música demoníaca. no primeiro exemplo é bom conhecer a fonte, a brilhante trilha de bernhard hermann para psycho, de 1960.
comentamos sobre a ideia de estrutura e translação: certas coisas podemos abstrair de um tipo de arte e aplicar em outro. a compreensão de algo em fotografia, por exemplo, como o artista/curador escolheu as fotos numa exposição, dá uma ideia de montagem – (unidade, contraste, sequência, variação, temática), que pode ser pensada também numa música, num filme, no modo como uma instalação funciona. soa muito abstrato? conseguimos exemplos mais concretos disso?
conversamos sobre coisas diversas, após apresentação de trabalhos de alunos e surgiram algumas sugestões:
(william) talvez seja interessante procurar por videopintura (Studio Artist) e/ou nos trabalhos de video pintura do leo souza.
(esork) após o trabalho surgiu a sugestão de que estude a noção musical da quadratura.
alguém perguntou sobre o i-dozer, e lembrei do álbum matrix, de ryoji ikeda, mais artístico/interessante.
(rafael) sugeriu assistirmos ao média la jetée, de ficção científica. (achei esse site com ele, mas não sei se está funcionando bem).
(gustavo) existe um (sub)gênero de montagem de vídeos chamado youtubepoop. esse artigo fala sobre isso.
(lorena) uma música que também usa o dito de marx, da banda rakta.
Ouvimos/vemos o trabalho Fotofonografia, de Thelmo Cristovam.
Falamos sobre imagem estéreo.
Falamos brevemente sobre paisagem sonora e gravação de campo (soundscape e field recording) e ouvimos um trecho de Continuum Unbound, de Michael Pisaro.
Há um livro do Murray Schafer que introduz e discute a noção de paisagem sonora: A Afinação do Mundo.
Visitamos o site SPSoundmap, de Renata Roman. Falamos brevemente sobre uma ideia de cartografia sonora.
estúdio do merce cunningham
10 regras para estudantes e professores, por john cage (na verdade, escritas por sister corita kent)
1. ache um lugar que você confie, e então, tente confiar nele por um tempo.
2. (deveres do estudante)
tire tudo que puder do seu professor.
tire tudo que puder dos seus colegas.
3. (dever do professor)
tire tudo que puder dos seus alunos.
4. considere tudo um experimento.
5. seja auto-disciplinado. isso significa achar alguém sábio ou esperto e escolher segui-los. ser disciplinado é seguir de um modo bom. ser auto-disciplinado é seguir do modo melhor.
6. siga o líder. <nada é um erro>. não há vencedores nem perdedores. só há fazer.
7. a única regra é trabalhar. se você trabalhar isso vai levá-lo a algo. são as pessoas que fazem todo o trabalho o tempo todo que eventualmente chegam a algo. você pode enganar seus fans, mas não outros jogadores.
8. não tente criar e analisar ao mesmo tempo. são processos diferentes.
9. seja feliz sempre quando você pode. desfrute-se. é mais leve do que você pensa.
10. nós estamos quebrando todas as regras, mesmo nossas próprias e como sabemos disso? deixando bastante espaço para qualidades “x”.
boas dicas:
sempre esteja por perto.
vá e venha a tudo.
sempre vá às aulas.
leia sempre tudo o que você puder por as mãos.
veja filmes com atenção e sempre.
guarde tudo. pode ser útil no futuro.