teoria da eleição: presidenciais 2018

1. fidelidade à aposta

sobre o voto para presidente. a razão para o voto para presidente é aquela justificada pelo melhor jogo. o melhor jogo não é um no qual um candidato passa, mas no qual dois passam. a configuração do melhor jogo não é “um ou outro”, mas “um contra o outro”. se o voto na chapa da incompetência “capitão/general/posto ipiranga” é uma espécie de delírio, ainda assim o melhor delírio, aquele para o qual me voluntário, é aquele no qual no jogo o resultado está em aberto. portanto, que a república da vila madá possa encontrar um adversário à altura, que não seja a pura performatividade do “vai dar certo sqn” do anti-petismo birrento, que parece simplesmente querer chutar o tabuleiro, por infantilidade.

2. vai dar certo

continuo achando o mais absurdo do bolsonarismo, a identificação com a incompetência e a ignorância e não todo o resto, que é o conteúdo apenas. nisso, como em outras áreas, continuo sendo um formalista. um ponto importante, entretanto, sobre o candidato é: ele não tem qualidades. tal como algo profundamente sem o lado positivo, ele é indefensável e portanto invencível – seu próprio ponto crítico é ele mesmo. não há muito por que ser contra ele, dado que ele é o próprio “contra” de si próprio. nesse sentido também, ele é o melhor candidato para o “vai dar certo” radicalizado: o “pensamento positivo” (wishful thinking, que já conota a derrocada da razão) tem seu momento mais verdadeiro quanto mais escancaradas forem as razões que prenunciem o fracasso. a maior promessa de sucesso é aquela em que o fracasso é mais do que garantido. esse é um dos grandes atrativos da chapa incompetente/ignorante/desastroso. uma genralização dunning krueger cujo slogan implícito poderia ser “vou me pintar com limão e ir assaltar banco”.

3. a eleição é o momento pós-moderno da política

a eleição é um jogo. o objetivo é eleger certas pessoas, isto é, fornecer empregos para apenas parte dos candidatos. mas uma vez realizado o jogo, não há vinculação alguma por parte dos jogadores e os concorrentes (mesmo quando um jogador é um concorrente). a vinculação que deveria existir é a daquela entre os empregados e seus planos de governo, isto é, seu planejamento de trabalho. mas mesmo nesse caso, votar não implica aceitar os planos, mas apenas contribuir para a seleção de um candidato. de modo que, justamente durante o período eleitoral, a ideologia se ausenta. ideologia, então, é apenas algo anterior e posterior às eleições. os trabalhos propriamente políticos, nesse sentido, são apenas aqueles a ocorrer exceto ali. “acreditar”, “postar impedimentos morais”, “declarar absurdos”, “assoprar apitos caninos”, “prometer”, “mostrar indignação”, “argumento do voto secreto” ou ainda “declarar suas escolhas” são apenas lances, avaliados efetivamente no momento da pontuação (e ainda: são apenas os lances não escusos). realizada a contagem, o predomínio da performance cai, e as coisas voltam ao normal, isto é, voltam a serem tomadas como relevantes de modo não numérico. “votar no menos pior” é uma maneira ressentida de declarar que o jogo é jogado, mas com um ar de superioridade moral: efetivamente entender que as eleições são o jogo, certamente de regras injustas, mas ainda assim, feito para selecionar candidatos, sem que se admita que a eleição não é o jogo da subscrição à princípios (que envolveria condições éticas muito maiores), e da fidelização a grupos (como a inscrição no partido seria). insistir que não somos os jogadores, mas apenas os elementos com os quais os concorrentes jogam é inaceitável do ponto de vista da liberdade (embora seja também um componente nas maneiras de dar lances que influenciam lances).

4. a culpa não é minha

o “a culpa não é minha” não é simplesmente algo modelado pelo conto do congestionamento. a posição reconhece que existem problemas. alguns bastante graves. e de partida postula que nenhum destes inclui o enunciador. até aí, compreensivo e similar: trata-se da auto-indulgência em que o problema são os outros. a questão é da ordem da adequação: se a pergunta levantada é “quem são os outros?” as respostas dadas recaem sob a pressuposição de que os outros devem continuar como outros. assim, toda vez que uma conversa puder levar a identificar alguém próximo e portanto, parte de nós e não a deles, a resposta deve acomodar esse alguém, mantendo o que recai sob o conceito de outro como vago, mas precisando alguns critérios locais, ad hoc, de não-pertencimento. na prática conversacional, portanto, o âmbito de aplicação vê-se constantemente diminuído localmente: você usa mas maconha mas é um sujeito esperto, meu amigo é gay mas é um bom amigo, é mulher independente mas honra a família, traiu e largou os filhos mas é patriota etc. porque se os culpados estiverem próximos demais, como eu poderei não ter relação de culpa nenhuma? ao explicitar essas colocações, de grau de separação em grau de separação, encontraremos um grande outro, que não é ninguém. entretanto, nisso há um erro: não há porque não aceitar que em certos contextos seja possível apontar o dedo, especialmente quando de olhos fechados.


postado em 5 de outubro de 2018, categoria comentários : , , , , , , , ,

comemorando o 7 de setembro: da ordem do discurso

aliás, que seja dito que “você é culpado até que prove sua inocência” é um dos bordões que mais representam o pensamento institucional no brasil hodierno.


postado em 8 de setembro de 2013, categoria comentários : , , , , , , , , ,