ao contrário do que teorizei em 2013, o não-bloco, agora que pude observá-lo caminhando durante algumas horas no domingo, do centro cultural são paulo até a paulista, descendo até o centro e virando para a república, apresenta-se como uma solução tipicamente paulista para as aglomerações carnavalescas. há sempre uma expectativa, mas em nenhum ponto do trajeto uma realização: pessoas semi-embriagas caminhando em direção a “mais caminhadas”, de uma felicidade contida, do deslocar-se, às vezes quase dançando – pequenos fragmentos de canto e coreografia; um clima de possibilidades (tensão de briga, olhares ansiosos por azaração), mas ao fim, conscientes da sensação de que há um objetivo virtual (o bloco), que é mero pretexto para o atual (o não-bloco), e que na verdade, esse último, que seria condição de existência para o primeiro, encontra-se aqui estável, invertendo a relação.
ânsia de poder como desaparecimento? segue uma pequena lista de momentos divertidos:
um senhor de 70 anos de idade vestindo uma camiseta larga branca, com bolinhas vermelhas, toca mp3 pendurado no pescoço, fazendo uma dança ridícula, mas com um balde ao lado, para que os transeuntes depositassem dinheiro.
um senhor de 60 anos de idade parado em uma escadaria, impassível, com óculos escuros e terno, segurando a coleira de seu cachorrinho de pelúcia (mas vejam, ela rompeu-se, a qualquer momento o dog pode escapar (?!)).
na frente do novo shopping (cidade?) plantaram alguns pau ferro, em buracos minúsculos. os paisagistas (?) sabem que essa árvore cresce bastante e por vezes cai, não? (imaginei isso acontecendo)
uma jovem de 20 anos de idade com a boca muito aberta e a língua inteiramente para fora, em pose pornográfica que no momento parecia ter sido realizada para tentar irritar dois rapazes hipócrito-libertinos, que se afastaram em seguida.
uma tentativa de formação de bloco, ao som deenter sandman, próximo ao anhangabaú, com uma adesão distanciada e não coordenada (aquele grupo estaria tentando dançar axé?).
um grupo de bichas capitalistas (homens e mulheres) entra no ônibus gritando qual é sua música do é o tchan predileta eu sou a loira do tchan segura o tchan o tchan na arábia cinderela baiana (meu limite para a ostentação do entrenimento é claramente ultrapassado).
terrorismo: um carro de som quase vazio e sem ninguém seguindo passa pela cidade tocando músicas para jesus.
um sujeito muito provavelmente mais novo do que eu me chama de jovenzinho nerd (eu deveria, ao invés de tirar fotos artísticas das cercas colocadas nas praças, o que era minha tarefa no momento, tirar fotos boçais de sua namorada supostamente gostosa).
no bloco das garotas solteiras os momentos mais interessantes foram os que lembram operações militares: abrir espaço para o caminhão, coordenar movimento e pausa, cordão descendo, empurra empurra, necessidade de coordenar coletivamente contra os desejos individuais, consideração de erros de planejamento, táticas redefindas a cada jogada, necessidade de estratégia.
considere-se o carnaval como a articulação de três classes de objetos: blocos carnavalescos, ajuntamentos a-carnavalescos e não-blocos.
1. a violência alegre com que um bloco empurra um não-bloco; a melancólica infiltração com que um não-bloco dissipa um bloco.
2. um ajuntamento a-carnavalesco do tipo “fome-almoço” a se formar ao meio dia.
3. não-blocos em movimento, varrendo a cidade com suas formações não-humanas, subindo e descendo – pequenos desertos, confetes ao vento, não-encontros, manchas de tinta. relação de exclusão com os blocos e de permeabilidade aos ajuntamentos.
neste dia 22 de fevereiro de 2012, 13h: avenida faria lima eu te odeio no.1. saída do metrô faria lima, com caminhada pela faria lima até a avenida juscelino kubischeck. durante a caminhada, deveremos produzir sons eletrônicos de baixa intensidade. quem quiser ir apareça. quem quiser combinar algo comigo ou com aquiles, nos escreva (ou comente essa postagem).
idéia e cartaz por aquiles guimarães, baseada em idéia de henrique iwao. recartaz por henrique iwao, a partir de cartaz de aquiles guimarães.
ficar algum tempo deliberadamente sem travar contato com algo é uma estratégia que tenho em alta estima. um ano sem comer chocolate (que eu então adorava), me fez perceber o quanto aquilo era ruim (não só para a saúde: o gosto, a mistura terrível de cacau, açucar e gordura).
alguns anos sem a nona de beethoven, e posso voltar a ouvi-la com lágrimas nos olhos (exceto o terceiro movimento: os movimentos lentos de beethoven são uma perda de tempo, esquemáticos e sem o lirismo contido do barroco, nem o arroubo dos românticos).
bloco pós-carnavalesco: músicas do cânone clássico cantadas em lalalá, traje de gala (hipster ou não). // dia 09 de março de 2011, 20h, avenida paulista, são paulo. duração: aproximadamente 2 horas.
bateria simples, megafone, instrumentos de percussão variados, coro lalalá. coordenação: felipe ribeiro.