crônicas da municipalidade #1

tenho horário marcado no bhresolve. é a segunda vez que vou. na primeira, apenas solicitei a data. fui tudo bem, exceto que não levei envelope. precisa sempre levar o envelope não se esqueça, está anotado no site, vou quebrar seu galho, mas precisa, pra colocar os documentos dentro viu? então, esperei a aprovação da solicitação. aprovada a solicitação, fui ao primeiro batalhão da pm, solicitar, dessa vez, policiamento. mesmo sendo evento mínimo, você deve solicitar policiamento. lá, a delegada (?) me perguntara, é praça 7 né, e eu distraído sim, mas não, não é, o evento é praça 6, a localização é que é praça 7 (aquela coisa da “minoração”). enfim, não, não risque o nome do evento no documento de solicitação de policiamento, por favor, e ela rabisca de volta 6 em cima do 7 rabiscado em cima do 6. depois, guias gam e comprovantes de pagamento das guias gam. sim, pra prover arte pro município a gente tem de pagar e enfrentar a prefeitura, cuja tarefa aparente é cobrar e dificultar o fornecimento de arte e cultura ao município. agendamento e aqui estou, já confirmei minha senha na fila para atendimento de confirmação de senhas. agora é só esperar (costuma ser rápido). srr09 guichê 11, uma loira cara de seleta (terceiro reich mineiro). entrego papéis, por que não deixou já tudo organizado e separado? e também dou-lhe o envelope pra colocar todos os documentos dentro. olha, são dois eventos e não um, precisa de duas documentações, você não trouxe, agende outra data e venha com duas, pera lá, mas eu não entendi isso, é um evento, praça 6, 17 e 24 de agosto, um evento em duas datas. rapaz, leia as informações, praça 6 #5 um evento, o outro praça 6 #6, esse é o significado de evento,volte quando estiver tudo lido e preenchido (eu li e preenchi, ao meu ver), então sem duas cópias do rg, do autocad da praça, da solicitação de policiamento, e os formulários e gams e comprovantes de pagamento gam, esses estão aqui mas as cópias não. precisa de dois envelopes também? não. então você vai colocar coisas duplicadas num envelope só. é, então você agende de novo e no próximo dia traga todos os documentos. mas moça, por favor, por favor etc, só vou até ali e xeroco, e ela reluta mas diz que sim, vai abrir uma exceção, mas olhe lá e preencha e separe absolutamente tudo antes de voltar no guichê dela (de modo algum seria impertinente de sugerir que ela use a foto-copiadora logo atrás dela, não sou louco). eu desço e é claro, especulação foto-copista, três páginas, a 1$50 ou no mínimo 90 centavos, é o quarteirão do esqueci a cópia disso e daquilo, no entorno do bhresolve, muita demanda, mas saco a moeda grande pago e subo, separo com um clips e entrego. ela aponta, isso aqui não tá preenchido, é o maldito x do “não temos gerador de energia”, espero muito que não tenhamos de ir ainda à cemig, pra eles, como diz meu colega, cobrarem caro pra fazerem um “gato legal” e assim liberar um ponto de energia, gosto muito mais da ideia da banquinha. ok, x, e agora bom humor, já é outra pessoa, seria a dose de sadismo burocrático diária necessária, já passou a cota, agora é só um trabalho, pegar, digitar, fazer piadas com as colegas, que bom, eu penso, se bem que ser mal humorado num ambiente daqueles é ruim pra mim mas eticamente correto, não? e enquanto pego os protocolos olho que ela usou um outro envelope, não o meu.


postado em 18 de julho de 2019, categoria crônicas : , ,

no real gabinete de leitura português

e., sujeito formal, simpático, comedido, habitante de são paulo, considera o prédio do real gabinete português de leitura, no rio de janeiro, o mais bonito do brasil. chegando lá, e com sua tese sobre o tempo na obra de a. em mãos, ou seja, na mochila, com ítens que a possibilitam, e. resolve trabalhar ali mesmo, nesse ambiente magnífico. pergunta ao guarda sobre essa possibilidade. este, responde, em bom carioquês, sei lá. vou chamar a gerente. e quando a moça chega e olha um e aí?, e. se explica todo: eu gostaria de utilizar o espaço, trouxe meu laptop, uns livros, escrevo uma tese sobre a., a concepção do tempo, como é que faço, ao que a gerente interrompe-responde, senta aí porra.

desconcertado, mas entendendo a diferença das culturas, e. ainda olha mais uma vez para a gerente, uma moça magra, algo atlética, deve correr na praia, pensa. ela já com desdém, indo embora, então e. se dirige a uma mesa, vou poder trabalhar, que bom. é aí que intervêm o pequeno poder, e a gerente, de costas, continuando sua saída, retoma, como que a partir de porra e como não quer nada, mas com o gostinho da sacanagem no canto do lábio: mas assina lá no guichê os documentos. e então quase pedem para e. o comprovante de residência que ele obviamente não trouxe. e e. não pode deixar de pensar o óbvio, podia ter simplesmente sentado ali como quem não quer nada, retirado o laptop, não tem quase ninguém aqui, estaria já trabalhando.

“malandro é malandro.”


postado em 2 de novembro de 2015, categoria crônicas : , , , ,

manifestações

1. se considerarmos a quantidade de tempo gasta com procedimentos bizantino-burocráticos, faltar uma vez por semana ao trabalho por causa de alguma manifestação não é nada.

2. concordemos com o colega mateus loner: as manifestações não são um sinal de decadência – se as coisas estivessem piorando as pessoas estariam inertes ou preocupadas em garantir o prato diário. pelo contrário: se há manifestações há excesso – energia, disponibilidade, coragem; esboços de soberania.


postado em 30 de maio de 2014, categoria comentários : , , , ,

medindo a quantidade de trabalho: Qt = 2(x+a)

a quantidade de trabalho para fazer algo por aqui pode ser medida assim: calcula-se um valor x teórico, correspondente ao trabalho a ser feito. dado que esse cálculo é imperfeito, e também o mundo e as coisas o são, a seu modo, é realista estipular uma margem de erro a (normalmente um valor positivo, mas por vezes, quando a sorte encontra-se ao lado do trabalhador, negativo). assim, a quantidade de trabalho Qt para fazer algo deve ser medida como:

Qt = n(x + a)

onde n são os impedimentos burocráticos, necessários ao retardamento e atravancamento do processo. para mim, ao menos, é tentador adicionar, “tal que n=2 ou n>2”, isto é: nas condições atuais, a burocracia sempre dobra a quantidade de trabalho necessária.


postado em 30 de novembro de 2011, categoria Uncategorized : , ,