Kimi no Na wa: Reminiscência

A sensação de estar procurando algo esquecido. É a partir dessa premissa que se estrutura O Seu Nome, para tecer a narrativa de acordo. Interessante como a reminiscência age lá como repetição de um tempo no outro, de um ser no outro, e também: do esquecimento na memória; do esvanecimento na ação. E remete ao mito dos andróginos, contado por Aristófanes no Banquete de Platão: no começo eram as almas gêmeas unidas. Mas o que é esse começo? A animação deve resolver, construindo-o com um enredamento de tempo mítico (sempre foi assim), tempo fora do eixo (acontecimento, momento único) e tempo circular (reencontro). Então, se os fios são entrelaçados para depois se desatar na atualidade, permanecem conectados como um nó virtual (結び – musubi), reminiscência.

Há um poema de Wisława Szymborska: Amor à primeira vista, do livro de 1993 Fim e Começo, <Koniec i początek>, que capta um sentimento similar. Ele faz parte da coletânea “Poemas”, publicado pela Companhia das Letras em 2011. A tradução é de Regina Przybycien.

Ambos estão certos
de que uma paixão súbita os uniu.

É bela essa certeza,
mas é ainda mais bela a incerteza.

Acham que por não terem se encontrado antes
nunca havia se passado nada entre eles.
Mas e as ruas, escadas, corredores
nos quais há muito talvez se tenham cruzado?

Queria lhes perguntar,
se não se lembram –
numa porta giratória talvez
algum dia face a face?
um “desculpe” em meio à multidão?
uma voz que diz “é engano” ao telefone?
– mas conheço a resposta.
Não, não se lembram.

Muito os espantaria saber
que já faz tempo
o acaso brincava com eles.

Ainda não de todo preparado
para se transformar no seu destino
juntava-os e os separava
barrava-lhes o caminho
e abafando o riso
sumia de cena.

Houve marcas, sinais,
que importa se ilegíveis.
Quem sabe três anos atrás
ou terça-feira passada
uma certa folhinha voou
de um ombro ao outro?
Algo foi perdido e recolhido.
Quem sabe se não foi uma bola
nos arbustos da infância?

Houve maçanetas e campainhas
onde a seu tempo
um toque se sobrepunha ao outro.
As malas lado a lado no bagageiro.
Quem sabe numa noite o mesmo sonho
que logo ao despertar se esvaneceu.

Porque afinal cada começo
é só continuação
e o livro dos eventos
está sempre aberto no meio.

Meia lua e lua inteira. E um belo lusco-fusco.

{君の名は, filme, 2016, nota 8/10}

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