Kado a Resposta Certa: a tecnologia e a diplomacia

カド tem seus problemas. O primeiro episódio promete um Shindo estrategista. Mas como ser estrategista perante um semi-Deus? A série não responde adequadamente a isso e segue sem nenhuma grande ideia digna de suas premissas (o que ocorre também esse ano em Re:Creators). Além disso, quase dispensa a única personagem carismática (Shinawa) e introduz desastradamente a figura da “futura esposa” (Tsukai), com seu duvidoso discurso no episódio 8: o homem como finalidade da natureza tal como ele a conhece e imagina, recusa ser menos que o seu último estágio e deve assim se permitir uma xenofobia superior. (a mesquinhez do discurso é justificada nos episódios seguintes, mas só a custo de largar os pontos de interesse da trama até então)

Entretanto, há duas questões de interesse perpassando a série: 1) o que introduzir para eliminar por vias indiretas vários problemas que afligem a humanidade? Isto é, algo que mude a forma de vida das pessoas de modo que boa parte dos problemas desapareçam (ou seja, um equivalente ficcional da renda básica universal). O ser anisotrópico tem suas soluções: energia abundante; eliminação da necessidade do sono; controle de parâmetros do espaço-tempo. A questão da tecnologia é aqui colocada como a redefinição indireta do que é importante. Entretanto, como ela é indireta, está envolta em incerteza quanto aos resultados. É por isso que tendemos a associar a tecnologia com algo que vem de fora, no sentido que a reorganização de um sistema se dá de modo emergente, por um estímulo alienígena ao mesmo. Aqui, apelamos pra figuras do inevitável: a destinação, por exemplo. O lado viral, que provoca “febre” por certos cacarecos. Como lidar com essa incerteza tem a ver com o equilíbrio entre o modo de vida, sua capacidade de resistência, e as ideias  e forças de “inevitabilidade”. Mas também com o modo como algo é introduzido, o que nos leva à segunda questão.

2) como introduzir esse algo de modo a que ele seja aceito? Em uma situação diplomática ideal, boa parte dos nossos problemas seriam dissolvidos, porque não haveria como criar e manter a possibilidade de vantagens estratégicas de um grupo perante outro; as potências de inimizade seriam reduzidas ao mínimo, e seria desnecessário manejar a criação de escassez e falta. E é por isso que Wam, a energia abundante, tem de ser introduzida de modo público e acessível e que não dependa de materiais especiais. A possibilidade de controlar e regulamentar deve estar fora de cogitação. Mas a velocidade de sua assimilação deve se dar também de modo especial: uma distribuição que segue rápida mas equilibra as pequenas diferenças de poder geradas com etapas de aprendizado em que os mais jovens, menos enraizados em disputas já desenhadas, possam aprender primeiro e melhor.

Nessa tradição de fornecer modelos de diplomacia para o encontro com o desconhecido, Kado segue exemplos como o livro A Mão Esquerda da Escuridão, de Ursula le Guin, e o conto História da Sua Vida, de Ted Chiang. Mas não consegue ser inteligente tal como quer nos fazer acreditar que o anisotrópico e Shindo sejam.

{正解するカド, série de animação de 12 episódios de 24 minutos, 2017, nota 4/10}

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